Cinema e Argumento

Na coleção… Longe do Paraíso

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Julianne Moore vivia a era de ouro de sua carreira com Longe do Paraíso, filme que lhe rendeu o prêmio de melhor atriz no Festival de Veneza e uma indicação ao Oscar de protagonista no mesmo ano em que concorria como coadjuvante por As Horas.

Hoje é impossível voltar no tempo para revisitar Longe do Paraíso sem vê-lo como o irmão primogênito de Carol. Em ambos os filmes, o diretor Todd Haynes coloca os anos 1950 de forma romantizada na tela para falar sobre preconceitos, mas com uma diferença fundamental para distinguir as duas obras na forma: enquanto o filme protagonizado por Cate Blanchett e Rooney Mara lançado este ano nos cinemas brasileiros evidencia o preconceito com a homossexualidade a partir de uma história de amor muito íntima e pessoal, o drama estrelado por Julianne Moore em 2003 opta pelo olhar mais amplo da sociedade, onde a protagonista, uma dona-de-casa que estampa colunas sociais por sua devoção ao lar e à família, é julgada pela opinião alheia e vê sua vida ser desconstruída quando descobre a verdadeira natureza sexual do marido ao mesmo tempo em que passa a se relacionar de forma “questionável” para os padrões da época com o seu jardineiro negro.

No centro de Longe do Paraíso estão os preconceitos e as contradições de uma conservadora população norte-americana (e por que não mundial?) dos anos 1950. Que sentido existe no posicionamento dos estadunidenses que abandonam uma piscina após a entrada de um negro na água, mas não hesitam em comer uma refeição preparada pela empregada negra uniformizada? E qual a real carga de preconceito existente no comentário aparentemente corriqueiro da melhor amiga que diz respeitar homossexuais, mas preferir “homens que são homens”? Nada panfletário ou gratuito ao abordar esses temas, Haynes acerta mesmo quando resolve ser mais expositivo, compensando a simplicidade do roteiro escrito por ele com uma direção que, cheia de estilo, engrandece o seu próprio texto. 

Frequentemente criticado por romantizar e florear demais a década de 1950 (e que mal há nisso?), o californiano usa estilo com inteligência – e, francamente, só implica mesmo quem quer: se Carol embeleza todo e qualquer frame, é porque faz todo sentido, já que estamos acompanhando o nascimento de uma paixão através dos olhos de uma jovem em plena descoberta amorosa; já em Longe do Paraíso, ele faz uma carta de amor ao cinema da década em questão, compondo o visual da obra com todas as características de uma produção daquela época. É como se a história realmente se teletransportasse para o passado tamanha a fidelidade estética, contemplando desde a perfeita estilização dos créditos iniciais à linda fotografia de Edward Lachman trabalhada toda a partir de equipamentos, lentes e técnicas características do fazer cinematográfico dos anos 1950. Novamente, toda a estilização está a serviço de uma inteligência muito maior. 

Contudo, seria fácil reduzir Longe do Paraíso a um filme meramente estético (os figurinos de Sandy Powell e a trilha de Elmer Bernstein também são fantásticos), pois toda essa romantização, além de servir como homenagem cinematográfica, age como um grande complemento narrativo para a vida cercada de aparências da protagonista. É notável a trajetória da Cathy Whitaker de Julianne Moore (o papel foi escrito especialmente para a atriz), que começa o filme perturbada com a descoberta da homossexualidade do marido e aos poucos percebe que a melhor saída para a sua vida é deixar de ser apenas “a grande mulher por trás de um grande homem”.

Interpretada magistralmente por Moore, que vivia a era de ouro de sua carreira (naquela temporada, conquistava Veneza por Longe do Paraíso e Berlim por As Horas), Cathy se descobre uma mulher à frente do seu tempo, o que, assim como em Carol, revela-se dolorosamente trágico. Não é fácil se apresentar ao mundo como realmente somos, e não há romantização que possa amortecer essa tristeza ainda tão presente nos dias de hoje, quando a paixão e a sexualidade alheia ainda são misteriosamente julgadas pela sociedade. Homossexual assumido, Todd Haynes sempre soube dessa batalha. E ele tem toda razão em tornar uma realidade triste por si em algo mais bonito, palatável e, por que não, idealizado. Afinal, às vezes, relatos como o de Longe do Paraíso precisam realmente de algum tipo de alento frente à dura realidade, seja ela a dos anos 1950 ou a de agora.

Na coleção… Johnny & June

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Tanto Johnny Cash (Joaquin Phoenix) quanto June Carter (Reese Witherspoon) eram estranhos dentro de suas próprias casas antes de alcançarem o estrelato no mundo da música. Ele, que vivia com uma mãe submissa, um pai alcoolista e à sombra do bondoso irmão, teve que abandonar o convívio familiar em uma longínqua fazenda do estado de Arkansas, nos Estados Unidos, para construir sua própria história depois da trágica e precoce morte do irmão, cuja culpa sempre lhe foi atribuída equivocadamente pelo pai. Já June Carter não veio de um ambiente tão conturbado, pois, desde criança, já sabia o que era o sucesso cantando com a irmã Anita nas rádios. O senso de não pertencimento, no entanto, era o mesmo que consumia Cash, uma vez que June sempre soube que a agraciada com grande talento vocal na família era a irmã, o que, segundo ela, levou-lhe a “fazer graça” nos palcos para que fosse notada de alguma forma. Não há dúvidas de que Johnny & June é infinitamente mais sobre Johnny Cash do que sobre June Carter, mas é a partir do encontro dessas duas histórias que o filme de James Mangold constrói a sua maior força: a de que o amor – o verdade mesmo, não o nascido a partir de conveniências ou do que os outros esperam – é realmente capaz de transformar carreiras, caminhos e pessoas.

Assim como o próprio filme, a mensagem não deixa de ser batida, mas tudo em Johnny & June é bem executado, o que se revela uma ótima surpresa quando é difícil encontrar biografias que assumam uma personalidade tradicional e ainda assim consigam empolgar de alguma forma. Tudo o que já conhecemos a respeito de uma produção nesse formato está presente aqui: a vontade de abarcar a maior quantidade de fatos possíveis, a clássica pegada motivacional para falar sobre um sujeito de origem humilde que conquista a fama aparentemente impossível, os percalços com drogas e bebidas e até a jogada de começar o filme pelo desfecho. Por isso faz a diferença ter um diretor como James Mangold atrás das câmeras. Com uma carreira marcada por vários projetos interessantes (IdentidadeOs Indomáveis Garota, Interrompida), Mangold nunca construiu uma assinatura em seus trabalhos, mas a experiência nos mais diversos gêneros influencia diretamente a segurança narrativa encontrada nesse filme. Ele, que também escreveu o roteiro em parceria com Gill Dennis, nunca torna Johnny & June um relato atropelado da vida de Johnny Cash, especialmente porque o longa dá conta por completo da personalidade do cantor norte-americano.

A duração excessiva permite que Johnny & June transpareça suas formalidades e seus eventuais descuidos, como o de nunca apresentar devidamente a dupla que começa a carreira com o protagonista e depois simplesmente some ou a verdadeira personalidade da primeira esposa do cantor, reduzida a ser a filhinha do papai cuja única função dramática é cuidar da casa e chorar pelo afastamento do marido. Tudo é amplamente compensado por um longa bem sucedido na construção de seu repertório musical (são apenas 11 as músicas interpretadas pelos protagonistas, e quase todas executadas apenas parcialmente) e que a todo momento nos leva ao que mais impressiona em todo o conjunto: a impecável interpretação de Joaquin Phoenix. Em mais um dos tantos momentos que nos lembram das razões de seu nome ser considerado um dos melhores em atividade, Phoenix dá literalmente voz e alma para um Johnny Cash extremamente crível e que ultrapassa qualquer acomodação envolvendo a mera reprodução de trejeitos tão corriqueira em cinebiografias. Reese Witherspoon, que, assim como Phoenix, também canta e toca todos os instrumentos em cena, é uma graça e tem sua parcela de contribuição para o ótimo romance do filme (o que, por outro lado, em nada justifica seu equivocado Oscar de melhor atriz). Entretanto, o show é mesmo de Phoenix nesse longa de emoções sinceras e que ainda segue um pouco mais com o espectador após a sessão, já que é impossível não recorrer à trilha sonora de tempos em tempos.

Na coleção… À Deriva

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Crianças e adultos sentem o tempo de forma muito diferente, e esse é um material riquíssimo para qualquer dramaturgia. À Deriva, dirigido por Heitor Dhalia em 2009, captura bem a tese ao trabalhar dois pontos de vista bastante distintos nesse sentido. Enquanto um veraneio em Búzios, no Rio de Janeiro, pode ser apenas uma pequena temporada de reflexões e discussões para que Clarice (Débora Bloch) e Matias (Vincent Cassel) tentem ajustar os ponteiros de um casamento em pedaços, é bem provável que a jovem Filipa (Laura Neiva), de 14 anos, sinta as semanas veranis como uma difícil e inconsciente jornada de amadurecimento rumo a respostas que só as dores da vida podem trazer. Os pais da garota não se atentam tanto a essa disparidade de tempos enquanto vivem momentos derradeiros de um casamento falido, mas Filipa, cercada por todos os questionamentos da transição para a vida adulta, sabe muito bem o que acontece em casa, o que só amplia a confusão emocional de uma temporada na praia que, em alguns dias, sintetiza o emocional de todos os membros da família.

Exibido na mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes, À Deriva é o exemplo máximo da sofisticação estética e narrativa do diretor pernambucano Heitor Dhalia, que, antes desse filme estrelado pela estreante Laura Neiva e pelos já conhecidos Débora Bloch e Vincent Cassel, havia dirigido NinaO Cheiro do Ralo. No roteiro escrito por ele, com colaboração de Vera Egito, o contexto e a desintegração familiar ganham frescor porque são narrados a partir do ponto de vista da filha do casal. Ao mesmo tempo em que acompanha o atrito entre os pais e secretamente descobre a infidelidade de um deles, a jovem precisa lidar uma adolescência que cada vez mais lhe impõe interesses amorosos e o inevitável desabrochar sexual. Muito à frente do tempo de seus amigos, ela, por de certa forma tomar consciência dessa sua evolução, acha que entende tudo da vida – e essa interpretação errada do que é de fato conhecer a vida lhe coloca equivocadamente a missão de tentar fazer alguma diferença dentro de casa, onde pensa que pode – e deve – influenciar determinadas resoluções que simplesmente estão fora de seu alcance.

Heitor Dhalia, que, logo após a realização de À Deriva viajou aos Estados Unidos para fazer o já esquecido 12 Horas com Amanda Seyfried, só ganha ao transferir a interpretação dos dramas para os olhos de Filipa, até porque, caso contado a partir de visões independentes dos núcleos, o resultado poderia ser dos mais mornos. E o saldo positivo não é apenas na questão do texto: Laura Neiva é espetacular como a garota que pode até não ter a nossa simpatia, mas cujos conflitos nunca despertam indiferença. Em seu primeiro trabalho no cinema (ela, infelizmente, não alcançou o reconhecimento que merecia, inclusive na TV), tira de letra um papel repleto de desafios e não fica devendo nada aos também ótimos Débora Bloch e Vincent Cassel. De estética impecável (não são apenas as belíssimas paisagens de Búzios que engrandecem a fotografia do já falecido Ricardo Della Rosa), À Deriva ecoa após a sessão, claro, pela linda e inesquecível trilha sonora de Antonio Pinto, e, acima de tudo, pela forma franca e natural com que transforma temas essencialmente convencionais em momentos pequenos, mas únicos em suas particularidades.

Na coleção… Hairspray – Em Busca da Fama

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Não são todos os musicais contemporâneos que conseguem ser tão bem resolvidos com sua própria identidade quanto Hairspray – Em Busca da Fama. Refilmagem do longa-metragem homônimo de 1988 (aqui no Brasil apenas o subtítulo E Éramos Todos Jovens foi modificado), esta nova versão dirigida por Adam Shankman encena uma história que, mesmo ambientada nos anos 1960, infelizmente ainda se mostra incrivelmente atual. Afinal, não é só a jornada de Tracy Turnblad (Nikki Blonsky), garota gordinha que ouve de todos (inclusive da própria mãe!) que nunca será uma estrela de TV ou conquistará o garoto mais desejado do colégio em função de seu peso, que se revela inspiradora na busca da quebra por preconceitos, mas também o retrato feito de uma época em que os negros não podiam frequentar a mesma piscina ou até mesmo a mesma pista de dança com os brancos. Tracy, que sabe muito bem o que é fazer parte das minorias, abraço como missão mudar tudo isso, especialmente o fato do Corny Collins’ Show, programa musical febre entre os jovens, aceitar negros em sua programação em apenas um dia do mês. Repleta de música, inocência e nostalgia, essa jornada da adorável protagonista terá suas previsibilidades, mas também será uma das mais autênticas que você verá nos musicais recentes.

Até surpreende o repentino talento do diretor Adam Shankman ao comandar Hairspray, visto que seus projetos anteriores a esse são de qualidade muito duvidosa (Operação BabáA Casa Caiu) ou de uma infinidade de clichês (Um Amor Para Recordar). Na refilmagem do musical, ele traz personalidade ao universo de Tracy Turnblad, colocando nele muita graça e doçura sem que o resultado pareça infantilizado ou até mesmo restrito a um público jovem (caso de muitos musicais como High School MusicalGlee). Claro que o elenco de veteranos dá certo respeito ao filme (Allison Janney, Christopher Walken, John Travolta, Michelle Pfeifer!), mas é notável como Hairspray acerta musicalmente em dois aspectos fundamentais: na escolha do ótimo repertório transposto para esta nova leitura (bônus: praticamente todas as canções são ferramentas narrativas!) e na seleção de um elenco talentoso em voz e carisma. Se John Travolta não é uma grande presença quando resolve cantar, dá gosto de ver Nikki Blonsky demonstrando plena segurança já na cena de abertura, por exemplo. A sequência final ao som de You Can’t Stop the Beat ainda justifica o porquê das premiações terem levado a sério esse grupo de atores, uma vez que Hairspray chegou a ser indicado ao Screen Actos Guild Awards de melhor elenco (algo raro para um filme menor, musical e cômico como esse).

O singelo mas crível design de produção nos ambienta perfeitamente neste filme de muitos sonhos que de repente se tornam realidade. Isso mesmo: não são necessários muitos minutos para você perceber que, apesar de um obstáculo ou outro, tudo dará certo em Haispray. Esse é o espírito que o filme assume sem qualquer medo, e basta entrar nele para curtir de verdade a história,  que tem uma simplicidade da mais sinceras – e por isso mesmo conquista tantos corações facilmente. Talvez tenha sido proposital o fato do diretor ter encenado as sequência musicais de forma tão tradicional (são muitos os momentos que usam planos bastante abertos para mostrar dezenas de pessoas alinhando uma coreografia perfeita), mas isso pode eventualmente frustrar quem busca um exemplar do gênero mais criativo e até ambicioso tecnicamente falando. Sinceramente, não vejo isso como um problema quando Hairspray surge tão autêntico quanto sua protagonista. Colorida, feliz e otimista. Assim é esta refilmagem que, além de tudo, é uma pequena mas valiosa homenagem à força das minorias. Musicais carinhosos como esse sempre fazem falta.

Na coleção… Amor Sem Escalas

UP IN THE AIR

Amor Sem Escalas tem uma premissa das mais trágicas, mas prefere seguir um caminho que demonstra a total maturidade de seu diretor: o da leveza. E está errado quem pensa que essa escolha amortece ou anula a força emocional do filme. Pelo contrário. Assim como Transamérica, por exemplo, Amor Sem Escalas se torna ainda mais agridoce em função de olhar para a tragédia a partir de pequenas felicidades e de momentos corriqueiros. A missão não é fácil: afinal, como não pesar a mão na história de Ryan Bingham (George Clooney), sujeito cujo emprego é demitir pessoas em todos os cantos dos Estados Unidos? Mais do que isso: como resistir à tentação de tornar depressivo este homem que viaja o ano inteiro, não tem qualquer raiz com família, amigos ou romances e ainda dá palestras que dizem que as relações são os componentes mais sufocantes da vida? Pois o diretor Jason Reitman, em parceria com Sheldon Turner no roteiro, realmente escolhe outras direções e entrega um trabalho que, ainda hoje, é o mais maduro de sua carreira.

Quando realizou Amor Sem Escalas, Jason Reitman recém havia saído de uma repentina (e superestimada) consagração por Juno, uma comédia adolescente sobre uma garota que enfrentava uma inesperada gravidez em circunstâncias atípicas (o filho era do menino mais “loser” da escola, e os pais não entraram em pânico com a notícia), o que poderia nos deixar em dúvida quanto às chances do diretor saltar com êxito para um projeto completamente oposto, sobre pessoas de meia-idade, casadas com a carreira e independentes. Seria Reitman um diretor apenas das angústias jovens? Ou também das reflexões maduras? Felizmente de ambas. E uma cena específica de Amor Sem Escalas sintetiza com perfeição não apenas o talento eclético do diretor como também todos os temas abordados no filme: aquela em que a jovem Natalie (Anna Kendrick), devastada por uma recente separação, tenta encontrar algum conforto nos conselhos de Ryan e Alex (Vera Farmiga). No impecável diálogo, estão as expectativas de diferentes gerações quanto aos relacionamentos e ao sucesso profissional – e o filme, apesar de ter como pano de fundo as demissões em massa que assolaram os Estados Unidos anos atrás (o que foi seu maior atrativo quando lançado), é exatamente sobre o que procuramos ou evitamos nessa transição entre a casa (onde quer que ela seja) e o trabalho.

Delicado e carinhoso, Amor Sem Escalas consegue desenhar o desabrochar de um homem distante de todos com uma precisão cirúrgica mas nada acadêmica. Não existe nada mais clichê do que um filme derrubar todas as verdades de um personagem quando ele encontra um relacionamento marcante, e o que Amor Sem Escalas faz é basicamente isso, com a diferença de ter um conjunto de acertos simples e discretos que pouco percebemos conscientemente a mudança deste homem, até porque Reitman prefere arquitetar a história de Ryan não com grandes acontecimentos, mas sim com uma conversa de bar ou com um breve encontro em um aeroporto. Clooney, em um de seus melhores momentos como ator, acha o ponto ideal entre seu charme marcante (é difícil vê-lo como um personagem e não como George Clooney) e a criação dramática do protagonista, melhorando em grande escala quando contracena com a igualmente ótima Vera Farmiga. Ambos foram indicados ao Oscar e formam um dos casais mais críveis e marcantes dos últimos anos. Dá gosto vê-los junto porque acreditamos que Ryan e Alex são de fato a versão do outro – só que de sexo oposto. Maturidade, sucesso profissional e independência estão estampados no comportamento dos dois, mas, quando estão juntos, surge também a discreta carência, o carinho nunca mostrado – e é aí que Amor Sem Escalas alcança seus momentos mais especiais.

Ao contrário do que o título brasileiro indica e até mesmo estes comentários avaliam, Amor Sem Escalas não é, porém, uma mera descoberta do amor em tempos de desconexão ou a escalada romântica de um homem solitário e convicto disso. Apesar de viverem belos momentos juntos e o filme pontuá-los com emoção (as conversas são inteligentes, a trilha é nostálgica), Ryan e Alex agem como se estivessem alheios tudo isso, como que seus êxitos profissionais – esses sim – fossem o bem mais precioso. O que conta mais para eles é quem tem o maior número de cartões ou qual o próximo destino de suas agendas profissionais. Eles se aproximam, mas parecem negar tal aproximação porque, novamente, a profissão e a independência estão acima de tudo – como se o fato de se acomodar com alguém fosse sinônimo de fracasso. E isso não é verdade, conforme eles próprios passam a perceber silenciosamente mesmo sem admitir. É no nascimento deste sentimento tão renegado por pessoas orgulhosas de não o terem que Amor Sem Escalas se torna tão agridoce, e a escolha de cercar a história com bom humor (muito dele centrado na personagem de Anna Kendrick) torna tudo um tantinho mais triste. Atual, já que estamos cada vez mais centrados em profissões do que relações, Amor Sem Escalas tem, assim, um coração muito grande, mas é o contraste com os pés bem firmes no chão que torna o resultado tão especial.

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