The time it took you to get out here whining like a bitch, Willoughby, some other poor girl’s probably out there being butchered.
Direção: Martin McDonagh
Roteiro: Martin McDonagh
Elenco: Frances McDormand, Sam Rockwell, Woody Harrelson, Peter Dinklage, John Hawkes, Caleb Landry Jones, Lucas Hedges, Abbie Cornish, Kerry Condon, Zeljko Ivanek, Amanda Warren, Selah Atwood, Darrell Britt-Gibson
Three Billboards Outside Ebbing, Missouri, EUA/Reino Unido, 2017, Drama, 115 minutos
Sinopse: Inconformada com a ineficácia da polícia em encontrar o culpado pelo brutal assassinato de sua filha, Mildred Hayes (Frances McDormand) decide chamar atenção para o caso não solucionado alugando três outdoors em uma estrada raramente usada. A inesperada atitude repercute em toda a cidade e suas consequências afetam várias pessoas, especialmente a própria Mildred e o detetive Willoughby (Woody Harrelson), responsável pela investigação.
6 de março de 2006. Foi logo na primeira hora desse dia, em plena madrugada, que milhões de cinéfilos do mundo inteiro acompanhavam atônitos uma das maiores reviravoltas do Oscar: Crash – No Limite, aos 45 do segundo tempo, desbancava o favorito absoluto O Segredo de Brokeback Mountain na categoria de melhor filme. O choque foi generalizado pela surpresa, claro, mas também porque Brokeback Mountain é reverenciado como uma obra-prima irrepreensível, enquanto Crash segue sendo acusado, entre outras coisas, de ser uma obra manipuladora e bagunçada em todas as suas discussões sobre racismo, xenofobia e qualquer tipo de intolerância. Considerado o pior vencedor do Oscar de todos os tempos, o longa assinado por Paul Haggis (diretor que esteve recentemente entre os inúmeros homens acusados de má conduta e assédio sexual em Hollywood) agora tem um irmão caçula: Três Anúncios Para Um Crime, filme equivocado que, por ser defendido por nomes respeitados e por se vender como uma comédia inteligente e politicamente incorreta, tem sido mais poupado do que deveria. E o pior: mais elogiado do que jamais mereceria, chegando ao Oscar 2018, inclusive, com toda pompa de favorito ao prêmio principal junto ao drama fantástico A Forma da Água.
Beira o chocante ver uma obra como Três Anúncios Para Um Crime flertando com celebração que tanto fez mal a Crash tempos atrás. Inclusive, um adendo se faz necessário: ainda que problemática para muitos, Crash era uma obra que, ao menos, tinha a autenticidade de assumir a série de coincidências que adotava como componente dramático de sua trama e, principalmente, a vontade de manipular as emoções do espectador. A situação é mais complicada com Três Anúncios Para Um Crime porque o filme se disfarça de obra esperta, temperamental e transgressora quando, lá no fundo, está repleta de problemas como as fáceis piadas de mau gosto com um personagem anão que só está ali para ser motivo de chacota e como a tão discutida redenção de um personagem racista (esse não chega a ser o maior dos problemas pois também precisamos refletir sobre até que ponto pessoas de ideias e conceitos discutíveis não podem ter algum material dramático digno de transformação ou evolução). O que faz o longa ser uma verdadeira bagunça são os pontos mais básicos do roteiro escrito pelo próprio diretor Martin McDonagh, que chegou a ser defendido como autor de um dos textos mais afiados dos últimos anos.
A arrancada por si só é aberta a questionamentos: McDonagh, que sempre foi conhecido pela utilização do humor (Na Mira do Chefe é um excelente exemplar desse seu talento), agora se confronta com uma história dramática e de pegada oposta aos seus trabalhos anteriores, que partiam da comédia para, aí sim, pensar em desdobramentos dramáticos. Em suma, Três Anúncios Para Um Crime nasce de uma ideia triste e provocadora: a de uma mãe que, desesperada, compra três outdoors em uma estrada para causar algum efeito nas investigações estagnadas do assassinato de sua filha, que foi estuprada até a morte. E aí vem piada atrás de piada, algumas delas eficientes na missão de potencializar sensações incômodos no espectador, mas que, no geral, não combinam com uma trama bem menos criativa do que o roteiro julga contar. É hiper rasa a dimensão dramática que McDonagh tenta dar aos seus personagens, incluindo a protagonista Mildred Hayes (Frances McDormand), que, bem defendida por Frances McDormand na medida do possível, já seria uma figura trágica, mas que o diretor insiste em dramatizar através de momentos até mesmo constrangedores, como no lamentável flashback onde ela, em uma histérica discussão, diz torcer para que sua filha seja estuprada por andar sozinha à noite pelas ruas, antecipando o que aconteceria tempos depois.
Três Anúncios Para Um Crime, contudo, não é centrado somente em Mildred, dividindo boa parte de sua história com outros personagens, em especial o policial racista e assumidamente escroto vivido por Sam Rockwell, um ator talentosíssimo que sempre serviu para qualquer papel. A divisão do protagonismo se dá na ideia da produção querer fazer, como o próprio diretor gosta de dizer, um amplo panorama desse mundo bagunçado que vivemos, como se fosse um doloroso mosaico em carne viva de pessoas que não sabem muito bem como reagir aos obstáculos e aos problemas da vida. Sob essa perspectiva, McDonagh, assim como no roteiro que Paul Haggis escreveu para Crash, coloca todas as cartas possíveis na mesa, fazendo a clássica confusão entre quantidade e qualidade. Tem questionamento sobre tudo o que você pode imaginar: abuso de poder, racismo, pedofilia, violência doméstica, e assim por diante… E quando digo que a quantidade se confunde com a qualidade é para elucidar, por exemplo, o desdobramento gratuito de uma amiga negra de Mildred que acaba na prisão. O momento quer falar sobre a frágil condição dos negros em situações onde autoridades brancas se aproveitam de condições privilegiadas, mas esquece que sequer sabíamos qualquer coisa sobre a personagem, antes uma mera figurante praticamente sem nome. Ora, quando uma personagem serve apenas de muleta para uma discussão temática, o roteiro se dilui.
A provocação mais inteligente de Três Anúncios Para Um Crime é não querer ser um filme de investigação, ainda que, no terço final, por um breve momento de sua última hora, decida o ser. A jogada esperta, que sabota de forma interessante várias expectativas, faz com que esse relato seja sobre o entorno do crime e sobre como uma decisão corajosa como a da protagonista é capaz de ter efeitos inesperados e fora de controle. Por mais que seja tortuoso como suspense, comédia e drama, é necessário reconhecer esse mérito que alivia um pouco a barra de uma obra cujo maior estofo está no talentoso elenco reunido aqui, todos bons por natureza e não por incentivo do filme. Por maior que seja a boa vontade com Três Anúncios Para Um Crime, é um árduo desafio compreender como um longa problemático e dispersivo como esse tenha chegando tão longe com o público e com a crítica desde a sua primeira elogiada exibição no Festival de Veneza em setembro do ano passado. Infelizmente, não é a experiência relevante que precisávamos sobre uma série de mazelas que atingem o conturbado mundo em que vivemos nos dias de hoje. Se o destino for justo, será apenas questão de tempo para que todos percebam a manipulação velada e os problemas reais de um filme cuja personalidade é somente confusa e fora de tom.
Pingback: Os vencedores do Oscar 2021 | Cinema e Argumento
Excelente post eu gostei muito o filme. Gosto muito os filmes de drama eles lidam com tópicos muito delicados e cotidianos que não devem ser negligenciadas. Eu assisti o filme O conto e ancho que é muito bom, tem uma história muito chocante, além de ter uma produção excelente, e o elenco faz um ótimo trabalho. Sem dúvida é umo dos melhores filmes de drama, boa história e elenco, achei um filme ideal para assistir e refletir, recomendo muito.