50º Festival de Cinema de Gramado #8: “Noites Alienígenas” é o grande vencedor de uma edição politizada e engajada

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50ª edição do Festival de Cinema de Gramado termina com prêmios equilibrados e cerimônia altamente politizada. Foto: Lou Cardoso.

Em uma noite extremamente engajada e politizada, o 50º Festival de Cinema de Gramado apresentou seus vencedores com várias surpresas das mais agradáveis, a começar pela consagração absoluta de Noites Alienígenas, o primeiro filme do Acre realizado para as salas de cinema com financiamento de edital. Por mais que Marte Um tenha causado imensa comoção e seja, de fato, um filme dos mais preciosos, a vitória de Noites Alienígenas coloca nos holofotes o cinema descentralizado e preocupado em compreender a produção audiovisual também por meio das fronteiras e das bordas desse imenso Brasil. Também não se exclui da equação a constatação de que trata-se de um trabalho muito bem realizado e de grande personalidade.

Com os troféus de melhor filme pelo júri oficial e da crítica, além dos prêmios de melhor ator para Gabriel Knoxx, atriz coadjuvante para Joana Gatis, ator coadjuvante para Chico Díaz e menção honrosa para Adanildo, Noites Alienígenas levou, ao todo, seis Kikitos para casa, enquanto Marte Um garantiu as vitórias de melhor roteiro, trilha musical e filme pelo júri popular. A MãeTinnitus também levaram três estatuetas. A boa surpresa do primeiro caso é ver que o júri observou os outros méritos de um longa-metragem que parecia destinado a levar apenas o merecido prêmio de melhor atriz para Marcélia Cartaxo. Quanto ao segundo longa, difícil compreender maior comoção, principalmente no que se refere à consagração em montagem, aspecto que, ao meu ver, é um dos mais problemáticos da obra. 

Também foram bastante equilibrados os vencedores da mostra de curtas-metragens, algo a ser celebrado, visto que o grande número de documentários com causas políticas e sociais tinha tudo para embolar o meio de campo. Acabou levando a produção que realmente foi o destaque da competição: o musical Fantasma Neon, de Leonardo Martinelli, sobre a precarização do trabalho de entregadores de aplicativos. A produção desembarcou em Gramado com o Leopardo de Ouro de melhor curta-metragem do Festival de Locarno e saiu da Serra Gaúcha com quatro Kikitos, seguido de perto por Último Domingo, consagrado em três categorias. Meu lamento maior deste segmento é apenas o pouco amor dado ao drama O Pato, de Antônio Galdino, que, aqui em casa, teria levado fácil o prêmio de melhor atriz para Norma Góes.

Se, de início, tinha a impressão de que o 50º Festival de Cinema de Gramado não estava fazendo um evento à altura de sua trajetória com as novidades anunciadas, logo a programação começou e fui lembrado de que, ao fim e ao cabo, são os filmes que ditam a grandeza do evento — e, com, exceção de apenas dois títulos, Gramado teve a seleção mais coesa e equilibrada de longas-metragens brasileiros em muitos anos. Isso foi o suficiente para marcar com louvor os 50 anos do evento. Simbolicamente, foi lindo ver outro momento que remonta à história do Festival: o intenso posicionamento político de praticamente todos os vencedores das mostras brasileiras. Raríssimos foram os discursos que não se posicionaram contra a política de desmonte cultural do atual governo. O palco de Gramado sempre foi assim, sem meias palavras. E sempre será, mesmo com as tentativas de apagamento da história e do tempo presente. Viva o cinema brasileiro e tudo o que ele tem a nos dizer! 

LONGAS-METRAGENS BRASILEIROS
MELHOR FILME: Noites Alienígenas, de Sérgio de Carvalho
MELHOR FILME (JÚRI DA CRÍTICA): Noites Alienígenas, de Sérgio de Carvalho
MELHOR FILME (JÚRI POPULAR): Marte Um, de Gabriel Martins
MELHOR DIREÇÃO: Cristiano Burlan (A Mãe)
MELHOR ATRIZ: Marcélia Cartaxo (A Mãe)
MELHOR ATOR: Gabriel Knoxx (Noites Alienígenas)
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE: Joana Gatis (Noites Alienígenas)
MELHOR ATOR COADJUVANTE: Chico Díaz (Noites Alienígenas)
MELHOR ROTEIRO: Gabriel Martins (Marte Um)
MELHOR FOTOGRAFIA: Rui Poças (Tinnitus)
MELHOR MONTAGEM: Eduardo Serrano (Tinnitus)
MELHOR TRILHA MUSICAL: Daniel Simitan (Marte Um)
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE: Carol Ozzi (Tinnitus)
MELHOR DESENHO DE SOM: Ricardo Zollmer (A Mãe)
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI: Marte Um, de Gabriel Martins, que trouxe o afeto para a tela
MENÇÃO HONROSA: Adanilo (Noites Alienígenas), pela excelência da construção da linha do personagem e interpretação.

LONGAS-METRAGENS ESTRANGEIROS
MELHOR FILME: 9, de Martín Barrenechea e Nicolás Branca
MELHOR FILME (JÚRI DA CRÍTICA): 9, de Martín Barrenechea e Nicolás Branca
MELHOR FILME (JÚRI POPULAR): La Pampa, de Dorian Fernández Moris
MELHOR DIREÇÃO: Néstor Mazzini (Cuando Oscurece)
MELHOR ATRIZ: Anajosé Aldrete (El Camino de Sol)
MELHOR ATOR: Enzo Vogrincinc (9)
MELHOR ROTEIRO: Agustin Toscano, Moisés Sepúlveda e Nicolás Postiglione (Inmersión)
MELHOR FOTOGRAFIA: Sergio Asmstrong (Inmersión)
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI: Direção de Arte de Jeff Calmet (La Pampa)

CURTAS-METRAGENS BRASILEIROS
MELHOR FILME: Fantasma Neon, de Leonardo Martinelli
MELHOR FILME (JÚRI DA CRÍTICA): Fantasma Neon, de Leonardo Martinelli
MELHOR FILME (JÚRI POPULAR): O Elemento Tinta, de Luiz Maudonnet e Iuri Salles
MELHOR DIREÇÃO: Leonardo Martinelli (Fantasma Neon)
MELHOR ATRIZ: Jéssica Ellen (Último Domingo)
MELHOR ATOR: Dennis Pinheiro (Fantasma Neon)
MELHOR ROTEIRO: Fernando Domingos (O Pato)
MELHOR FOTOGRAFIA: Fernando Macedo (Último Domingo)
MELHOR MONTAGEM: Danilo Arenas e Luiz Maudonnet (O Elemento Tinta)
MELHOR TRILHA MUSICAL: “Nhanderekoa Ka´aguy Porã” Coral Araí Ovy e Conjunto Musical La Digna Rabia (Um Tempo Pra Mim)
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE: Joana Claude (Último Domingo)
MELHOR DESENHO DE SOM: Alexandre Rogoski (O Fim da Imagem)
MENÇÃO HONROSA: Imã de Geladeira, de Carolen Meneses e Sidjonathas Araújo, por catapultar a urgente discussão sobre o racismo estrutural através do horror cósmico
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI: Serrão, de Marcelo Lin, pelo frescor da narrativa a partir de um olhar ressignificado, emergente e com o coração no lugar certo
PRÊMIO CANAL BRASIL DE CURTAS: Fantasma Neon, de Leonardo Martinelli

LONGAS-METRAGENS GAÚCHOS
MELHOR FILME: 5 Casas, de Bruno Gularte Barreto
MELHOR FILME (JÚRI POPULAR): 5 Casas, de Bruno Gularte Barreto
MELHOR DIREÇÃO: Bruno Gularte Barreto (5 Casas)
MELHOR ATRIZ: Anaís Grala Wegner (Despedida)
MELHOR ATOR: Hugo Noguera (Casa Vazia)
MELHOR ROTEIRO: Giovani Borba (Casa Vazia)
MELHOR FOTOGRAFIA: Ivo Lopes Araújo (Casa Vazia)
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE: Gabriela Burk (Despedida)
MELHOR MONTAGEM: Vicente Moreno (5 Casas)
MELHOR DESENHO DE SOM: Marcos Lopes e Tiago Bello (Casa Vazia)
MELHOR TRILHA MUSICAL: Renan Franzen (Casa Vazia)
MENÇÃO HONROSA: Clemente Vizcaíno (Despedida), pela presença destacada no filme e por sua importância na história do cinema gaúcho, e Campo Grande é o Céu, de Bruna Giuliatti, Jhonatan Gomes e Sérgio Guidoux, pelo resgate da tradição de cantorias e da importância das comunidades quilombolas daquela região do Rio Grande do Sul

LONGAS-METRAGENS DOCUMENTAIS
MELHOR FILME: Um Par Pra Chamar de Meu, de Kelly Cristina Spinelli.
MENÇÃO HONROSA: Elton Medeiros – O Sol Nascerá, de Pedro Murad, pela valorização do compositor, parceiro dos grandes nomes da música popular brasileira, e também pelo rigor formal e criativo na recriação visual da vida e das grandes composições de Elton Medeiros, que faleceu em 2019

MOSTRA UNIVERSITÁRIA (CONEXÕES – GRAMADO FILM MARKET)
MELHOR FILME: Ícaro, de Wesllen Machado (RS) 

3 comentários em “50º Festival de Cinema de Gramado #8: “Noites Alienígenas” é o grande vencedor de uma edição politizada e engajada

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