Melhores de 2021: roteiros, direção e filme

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MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
Christopher Hampton e Florian Zeller (Meu Pai)

O que mais admiro em adaptações teatrais para o cinema é a capacidade de um roteiro conseguir tirar o melhor da natureza dos palcos e eliminar tudo o que poderia parecer um teatro filmado. Meu Pai faz isso com louvor. Transpondo um texto muito premiado na Europa — Lé Père, vencedor do prestigiado Moliére de melhor peça em 2014 — Christopher Hampton e Florian Zeller transformam o material original de autoria do próprio Zeller em uma grande imersão a partir de elementos que, nas mãos erradas, poderiam limitá-lo: um único cenário, pouquíssimos personagens, ação centrada em diálogos, etc. Zeller foi certeiro ao chamar Hampton para esse trabalho, visto que ele é um mago das adaptações — afinal de contas, não é qualquer roteirista de Hollywood que tem na conta filmes como Ligações PerigosasDesejo e Reparação. Juntos, eles entregam um roteiro de grandes dimensões emocionais e de desdobramentos e surpresas que acompanham o espectador até o último minuto de projeção, quando Meu Pai encerra a sua dolorosa jornada com o momento de maior baque emocional de 2021.

DRUK

MELHOR ROTEIRO ORIGINAL
Thomas Vinterberg e Tobias Lindholm
(Druk: Mais Uma Rodada)

Para o espectador mais desavisado, Druk: Mais Uma Rodada pode soar como uma divertida brincadeira, pois a arrancada se dá a partir da descoberta de um estudo sobre como precisamos compensar um déficit de álcool no sangue para equilibrar a vida cotidiana. Só que há uma virada de chave na euforia vivida pelos quatro amigos que abraçam essa teoria, e Druk passa a refletir sobre o que pode ter levado os personagens a buscarem por algum tipo de ânimo em seus dias. Para tanto, o roteiro escrito por Thomas Vinterberg e Tobias Lindholm mergulha nas crescentes doses alcoólicas de Martin (Mads Mikkelsen) e transforma brincadeira em melancolia. O âmago do roteiro é essa acertada decisão de tentar entender como os personagens foram descaracterizando as suas próprias vidas ao ponto de precisarem de alguns goles de vodka já no café da manhã para voltarem a brilhar. Vinterberg e Lindholm se movimentam por essa premissa com profundidade e humanidade, preocupados em manter a palpabilidade desses quatro homens entre o drama e a comédia, regadas pelas habituais inteligências do cinema dinamarquês.

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MELHOR DIREÇÃO
Jane Campion (Ataque dos Cães)

Aproximando-se dos 70 anos de idade, a cineasta Jane Campion diz que já começa a pensar no seu legado. Mais do que olhar para trás, o que importa, segundo ela, é fazer filmes surpreendentes e sem amarras daqui para frente. Ataque dos Cães já é um deles. Não que outros trabalhos de Campion não o sejam, mas esse longa que lhe rendeu o Leão de Prata de melhor direção em Veneza e, posteriormente, o Oscar na mesma categoria representa algo novo em sua carreira: pela primeira, ela conta uma história centrada em uma figura masculina. E o faz, claro, surpreendendo, como bem quer fazer. Após conseguir viabilizar a adaptação do livro homônimo de Thomas Savage que já havia sido planejada pelo menos cinco vezes, Campion imediatamente procurou Annie Proulx, autora do conto que deu origem a O Segredo de Brokeback Mountain para apurar seu olhar sobre um projeto que gosta de enxergar como uma espécie de pós-western. Esse seu comprometimento com a inovação é o que faz de Ataque dos Cães um filme único. Campion recusa ferramentas fáceis e confia na capacidade do público de entrar na psique dos personagens, revelando-os pouco a pouco. Por meio de nuances e de uma rigorosa atmosfera, ela dá aula sobre como as reticências podem ser muito mais poderosas do que qualquer manipulação fabricada.

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MELHOR FILME
Meu Pai

Meu Pai pode muito bem ser considerado o filme definitivo sobre demência que o cinema de língua inglesa tenta fazer há muitos anos. Escapa à memória qualquer projeto tão devastador e imersivo como esse assinado pelo diretor Florian Zeller, adaptando um espetáculo teatral de autoria própria. Encharcado de terror ao colocar o espectador diante de um destino de vida do qual ninguém está livre, Meu Pai é um exercício de empatia executado com maestria, da interpretação magistral de Anthony Hopkins a detalhes técnicos que se revelam fundamentais para a narrativa, como a montagem e o design de produção. Também transfere um texto teatral para o cinema sem cacoetes tão comuns em adaptações dessa natureza, muito em função da parceria de Zeller com Christopher Hampton no roteiro. É o tipo de filme que perdurará como um relato avassalador da demência, mas, acima de tudo, como um verdadeiro exemplo de como ainda é possível revolucionar o relato de temas desgastados por fórmulas e impressionar cinematograficamente sem maneirismos ou distrações.

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