MELHOR ATOR COADJUVANTE
Kodi Smit-McPhee (Ataque dos Cães)
É praticamente impossível entender o que se passa na mente de Peter, o jovem vivido por Kodi Smit-McPhee que acaba girando as engrenagens de Ataque dos Cães. Alto e esguio, ele parece se movimentar em um universo próprio, revelando-se aos poucos para o espectador e comunicando muito através da linguagem corporal. Para além da questão física, Smit-McPhee brilha por compreender que seu personagem não tem um arco propriamente dito: o que ele faz é estimular e intrigar a plateia com um jovem cujas grandes transformações aconteceram na vida pregressa ao início do filme. Traumas, inseguranças e receios relacionados à sua essência já surgem resolvidos em Ataque dos Cães, e é justamente essa segurança de ser quem ele é que desestabiliza Phil (Benedict Cumberbatch). Entre a delicadeza de ser o filho que zela pela própria mãe e os movimentos sinuosos de uma personalidade bastante particular, o ator dá conta de várias questões sobre ideais de masculinidade ainda muito presentes e confere complexidade a um personagem laudatório das melhores qualidades de Ataque dos Cães.
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
Jessie Buckley (A Filha Perdida)
Interpretando a mesma personagem, mas em momentos diferentes de vida, Jessie Buckley e Olivia Colman nunca sentaram para conversar ao longo de toda a realização de A Filha Perdida. Inclusive, elas não acreditavam em tal necessidade — o que muito agradou a diretora Maggie Gyllenhaal, que organizou os distintos recortes da protagonista Leda como se elas fossem ecos, previsões e reminiscências de uma vida marcada pela inadequação ao que a sociedade exige das mulheres, especialmente daquelas que se tornam mães. Buckley é uma maravilhosa escalação para a versão nova da personagem porque, claro, é boa atriz, e porque tem instintos parecidos com os de Olivia Colman no que tange escolha de projetos e o tipo de papeis que gosta de interpretar. Sem jamais julgar Leda, ela já dá pistas dos sentimentos e das circunstâncias que a moldaram, equilibrando-se nessa eterna corda bamba que a vida nos coloca de sermos capazes de fazer tanto escolhas boas quanto ruins. É mais um atestado bastante claro e instigante de que Jessie Buckley está entre as melhores atrizes de sua geração.
MELHOR ATOR
Anthony Hopkins (Meu Pai)
Anthony Hopkins disse em várias entrevistas que foi muito fácil fazer Meu Pai. Sua teoria é de que Florian Zeller e Christoper Hampton escreveram um roteiro tão extraordinário e Olivia Colman foi uma parceira tão ímpar em cena que tudo o que ele precisava fazer era se deixar levar. Se realmente foi tão fácil como Hopkins diz, só podemos deduzir que o foi porque, à parte o talento, há coisas que um ator conquista apenas com a experiência, entre elas, a capacidade de encarar desafios com naturalidade. Sem nunca ter tido uma experiência próxima envolvendo Alzheimer ou doenças do gênero, o ator, apesar disso, colocou-se na pele do protagonista como se tivesse acompanhado uma história como essa de perto. O olhar profundo e generoso com que ele abarca um complicadíssimo dilema do qual ninguém está livre (o que fazer quando as pessoas que você ama começam a perder as suas estruturas?) é de partir o coração, principalmente porque o protagonista, preso na ideia de que está seguro de si como sempre esteve a vida inteira, luta para tentar dar algum sentido ao que acontece já não consegue mais entender. Tenho sempre muita cautela ao afirmar que determinado desempenho é o melhor da carreira de alguém. No entanto, no caso de Anthony Hopkins em Meu Pai, a exceção pode ser feita sem qualquer medo.
MELHOR ATRIZ
Olivia Colman (A Filha Perdida)
Resumidamente, a expressão norte-americana taken for granted seria como o ato de tomar algo como certo ou garantido, sem que fosse digno de maior atenção e celebração por já ter se consolidado o suficiente. Pode ser uma percepção prematura, mas desconfio que Olivia Colman, assim como tantas outras atrizes extraordinárias, já se encaixe no taken for granted por ter recebido um Oscar dos mais justos por A Favorita e por não ter errado a mira depois de tal celebração, participando de séries como The Crown e Fleabag ou do extraordinário Meu Pai, filme em que atuou ao lado de Anthony Hopkins. É apenas esse taken for granted que explica o fato de Olivia não ter varrido premiações e festivais com a sua performance em A Filha Perdida. Olivia traz entendimento e camadas a uma personagem difícil de definir e de gostar, evitando transformá-la em uma louca e, ao mesmo tempo, renegando a ideia de torná-la palatável ao público. A Leda mais madura da atriz e interpretada na juventude por Jessie Buckley carrega remorsos e (in)certezas traduzidos em cada inflexão de uma intérprete com a rara capacidade de sempre surpreender, impactar e fazer com que tudo pareça tão natural. Celebrar Olivia Colman nunca deve ser demais.
MELHOR ELENCO
Shiva Baby
São muitas as variáveis que podem definir um bom elenco. Número de atores? Sinergia entre eles? Equivalência na grandeza de interpretações? Acertos em todas as escalações? Ao meu ver, não há uma resposta certa. Há elencos excepcionais que, formados por apenas três ou quatro pessoas, garantem aulas de atuação, como em Dúvida, premiado nessa respectiva categoria aqui no blog, e há casos como o de Shiva Baby, que conjuga de tudo um pouco, passando por um número volumoso de atores, pela excelente dinâmica estabelecida entre eles e por um grande equilíbrio de talentos. Encabeçado pela performance reveladora de Rachel Sennott (apenas em seu segundo longa-metragem, mas demonstrando um domínio singular), o elenco de Shiva Baby se engrandece ao tornar crível a dinâmica de uma família deveras particular e repleta de personalidades tão distintas quanto complementares, com particular também para Polly Draper, que interpreta a mãe da protagonista. Em pouco menos de 80 minutos, todos têm papel fundamental na construção do grande sentimento de claustrofobia que permeia o longa de estreia de Emma Seligman.