
Bong Joon-ho subiu quatro vezes ao palco do Dolby Theatre para receber os prêmios de melhor filme, direção, roteiro original e filme internacional para Parasita.
Novos tempos pareciam chegar em Hollywood quando o Oscar premiou Moonlight em 2017. Um filme independente, dirigido por um cineasta negro e preocupado com causas importantíssimas com a devida representatividade? Coisa rara. No entanto, eis que dois anos depois, o Oscar premiava Green Book, um longa incrivelmente empoeirado que discutia questões raciais como se estivesse nos anos 1970, trazendo novamente o white savior para aliviar a consciência das plateias brancas em relação ao racismo. De que adiantou, portanto, premiar Moonlight se, logo em seguida, houve tamanho retrocesso com Green Book?
A partir desse cenário, era de se esperar que o Oscar 2020 seguisse a tendência de todos os outros prêmios e consagrasse 1917, mais um filme de guerra estrelado por pessoas brancas e reverenciado pelo grandioso espetáculo técnico que Hollywood gosta de premiar. Contudo, eis que a Academia, em um surto raro de lucidez, dá a volta por cima e premia Parasita com as estatuetas de melhor filme, direção, roteiro original e filme internacional. Em 92 anos, o Oscar nunca havia celebrado uma produção de língua não-inglesa na categoria principal. História foi feita. E Hollywood, de repente, saiu de seu próprio umbigo para descobrir que cinema é uma linguagem universal, independentemente de legendas. Não nos iluda, Academia. Isso precisa ser o sinal de novos tempos.
O que tal vitória de fato significa para o futuro e para a própria indústria hollywoodiana só o tempo poderá dizer, mas, a curto prazo, a vitória de Parasita dita tendências muito claras quando coloca os Estados Unidos a reverenciar uma produção asiática que transita pelos mais diferentes gêneros. Foi a compensação perfeita para uma cerimônia esquizofrênica do ponto de vista de entretenimento. Como explicar, por exemplo, Eminem cantando Lose Yourself sem a menor explicação em pleno 2020? Ou então o número de abertura que tem a cara de pau de fazer referências a Midsommar, Nós e Meu Nome é Dolemite, filmes que sequer foram indicados em qualquer categoria? Excessivamente musical, assistir ao Oscar 2020 como um programa de TV foi uma tortura.
Na reta final, a situação mudou de cenário quando a cerimônia se dedicou mais aos prêmios e deixou os vencedores falarem (Renée Zellweger e, especialmente, Joaquin Phoenix deram discursos marcantes, desobedecendo o tempo limite de fala de 45 segundos). Ainda há muito o que se falar sobre o Oscar 2020, que, por exemplo, fez O Irlandês de Martin Scorsese sair de mãos abanando enquanto entregava duas estatuetas preguiçosas para Ford vs. Ferrari. Entretanto, por ora, a euforia com as vitórias sem precedentes de Parasita sintetiza muito bem as incríveis lembranças que ficam da cerimônia. Digam o que quiser do Oscar, mas, para o bem ou para o mal, ele segue sendo o prêmio mais autêntico e surpreendente da temporada.

Plateia do Oscar 2020 se mobiliza com a celebração de Parasita.
Confira abaixo a lista de vencedores:
MELHOR FILME: Parasita
MELHOR DIREÇÃO: Bong Joon-ho (Parasita)
MELHOR ATRIZ: Renée Zellweger (Judy: Muito Além do Arco-Íris)
MELHOR ATOR: Joaquin Phoenix (Coringa)
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE: Laura Dern (História de Um Casamento)
MELHOR ATOR COADJUVANTE: Brad Pitt (Era Uma Vez Em… Hollywood)
MELHOR ROTEIRO ORIGINAL: Parasita
MELHOR ROTEIRO ADAPTADO: Jojo Rabbit
MELHOR FILME INTERNACIONAL: Parasita
MELHOR DOCUMENTÁRIO: Indústria Americana
MELHOR ANIMAÇÃO: Toy Story 4
MELHOR TRILHA SONORA: Coringa
MELHOR CANÇÃO ORIGINAL: “(I’m Gonna) Love Me Again” (Rocketman)
MELHOR MONTAGEM: Ford vs. Ferrari
MELHOR DESIGN DE PRODUÇÃO: Era Uma Vez Em… Hollywood
MELHOR FOTOGRAFIA: 1917
MELHOR FIGURINO: Adoráveis Mulheres
MELHOR MIXAGEM DE SOM: 1917
MELHOR EDIÇÃO DE SOM: Ford vs. Ferrari
MELHOR MAQUIAGEM & PENTEADOS: O Escândalo
MELHORES EFEITOS VISUAIS: 1917
MELHOR CURTA-METRAGEM: The Neighbors’ Widow
MELHOR CURTA-METRAGEM (ANIMAÇÃO): Hair Love
MELHOR CURTA-METRAGEM (DOCUMENTÁRIO): Learning to Skateboard in a Warzone (If You’re a Girl)
A vitória de “Parasita” foi uma surpresa bastante agradável, mas não sei se isso significa que a Academia esteja mudando… Prefiro ver como serão os próximos anos para podermos confirmar esta tendência.