46º Festival de Cinema de Gramado #8: balanço geral da premiação

Ferrugem, de Aly Muritiba, é o grande vencedor do 46º Festival de Cinema de Gramado. Foto: Edison Vara/Pressphoto

Com uma cerimônia efervescente do ponto de vista político, o Festival de Cinema de Gramado encerrou a sua 46º edição no último sábado, 26 de agosto. O filme escolhido pelo júri oficial como o melhor da equilibrada seleção de longas-metragens brasileiros foi o drama Ferrugem, de Aly Muritiba, que já tem estreia prevista no circuito brasileiro para o dia 30 de agosto. Acompanhando os desdobramentos trazidos pelo vazamento de um vídeo íntimo na internet, o longa também faturou os Kikitos de melhor roteiro e melhor desenho de som. Ferrugem, no entanto, não foi o grande vencedor da noite: Benzinho, de Gustavo Pizzi, a grande unanimidade desta edição, levou para casa os prêmios de atriz para Karine Teles e atriz coadjuvante para Adriana Esteves, além dos Kikitos de melhor filme pelo júri popular e pelo júri da crítica. É no mínimo estranho Benzinho não ter encantado o júri oficial, especialmente quando público e crítica concordam que este era o melhor filme em competição. Não que Ferrugem não tenha méritos, mas Benzinho é o tipo de filme que será lembrado como uma indiscutível pérola do cinema nacional recente (e é bem provável que, com razão, ainda seja escolhido como o representante do Brasil para tentar uma vaga no Oscar de melhor filme estrangeiro).

No geral, a lista contemplou a grande pluralidade da seleção deste ano, deixando apenas dois filmes sem prêmios: O Avental Rosa, de Jayme Monjardim, e Mormaço, de Marina Meliande. O primeiro, definido por Monjardim como um trabalho muito pessoal e autoral, realmente merecia passar despercebido por sua linguagem altamente televisiva e melodramática, mas o segundo ter saído de mãos abanando é um pequeno crime, pois é contundente a análise sócio-política que a diretora faz de um Brasil em franca transformação urbana e que, durante esse processo, oprime os menos favorecidos. Também é um pouco surpreendente a vitória de André Ristum como melhor diretor por A Voz do Silêncio: seu amadurecimento como realizador desde O Outro Lado do Paraíso se traduz na tela, mas, particularmente, acredito que os trabalhos de Gustavo Pizzi e Marina Meliande sejam mais complexos e inovadores. 

Osmar Prado e o seu Kikito de melhor ator por 10 Segundos Para Vencer. Foto: Edison Vara/Pressphoto

Entre as categorias técnicas, foram acertados os três Kikitos para Simonal e a menção honrosa para a animação A Cidade dos Piratas, do veterano Otto Guerra, lembrada, segundo o júri, por seu “humor não domesticado”. Contudo, nenhum momento foi tão emblemático ou comovente quanto a vitória de Osmar Prado por 10 Segundos Para Vencer, a sua primeira por um papel como protagonista em cinema ao longo de 60 anos de carreira. Pelo desempenho em si, a consagração já seria comovente (e sua emoção era genuína), mas, ao defender o ex-presidente Lula, hoje “injustamente trancafiado nas masmorras de Curitiba”, mobilizou vaias e aplausos no cinema. Para os contrários, disse “pode vaiar”. Para os que compartilhavam do sentimento, ergueu o Kikito com orgulho. Certamente, um dos momentos mais memoráveis do Festival de Cinema de Gramado nos últimos anos, fazendo jus ao engajamento e  à resistência que fizeram do Palácio dos Festivais um templo do cinema brasileiro. Ainda no plano nacional, foram bem divididas as consagrações entre os curtas-metragens. Assim como nos longas, a escolha do júri oficial (a animação Guaxuma) não coincidiu com o queridinho da crítica e do público (a também animação Torre). Felizmente, a discordância não é grave: tanto Guaxuma quanto Torre são, ao mesmo tempo, filmes pessoais e universais, além claro, de serem animações, gênero que cresce cada vez mais no cenário audiovisual brasileiro. Se há alguma ressalva na lista, essa é a do pouco caso com Nova Iorque, comovente produção estrelada por Hermila Guedes e pelo pequeno Juan Calado, que saiu de Gramado somente com o Kikito de melhor fotografia e com o prêmio do Canal Brasil para curtas. Chegando aos longas estrangeiros, “somente” não se aplica aos oito prêmios recebidos por As Herdeiras, sendo três para as atrizes Ana Brun, Margarita Irun e Ana Ivanova. Dirigido por Marcelo Martinessi, o filme foi considerado pela crítica como o franco favorito para fazer o Paraguai estrear na disputa pelo Oscar de filme estrangeiro.

Confira abaixo lista completa de vencedores da 46ª edição do Festival de Cinema de Gramado:
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LONGAS-METRAGENS BRASILEIROS

MELHOR FILME: Ferrugem, de Aly Muritiba
MELHOR DIREÇÃO: André Ristum (A Voz do Silêncio)
MELHOR ATRIZ: Karine Teles (Benzinho)
MELHOR ATOR: Osmar Prado (10 Segundos Para Vencer)
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE: Adriana Esteves (Benzinho)
MELHOR ATOR COADJUVANTE: Ricardo Gelli (10 Segundos Para Vencer)
MELHOR ROTEIRO: Jessica Candal e Aly Muritiba (Ferrugem)
MELHOR DESENHO DE SOM: Alexandre Rogoski (Ferrugem)
MELHOR TRILHA MUSICAL: Max de Castro e Wilson Simoninha (Simonal)
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE: Yurika Yamazaki (Simonal)
MELHOR MONTAGEM: Gustavo Giani (A Voz do Silêncio)
MELHOR FOTOGRAFIA: Pablo Baião (Simonal)
MENÇÃO HONROSA: A Cidade dos Piratas, de Otto Guerra
MELHOR FILME – JÚRI POPULAR: Benzinho, de Gustavo Pizzi
MELHOR FILME – JÚRI DA CRÍTICA: Benzinho, de Gustavo Pizzi

LONGAS-METRAGENS ESTRANGEIROS

MELHOR FILME: As Herdeiras, de Marcelo Martinessi
MELHOR DIREÇÃO: Marcelo Martinessi (As Herdeiras)
MELHOR ATRIZ: Ana Brun, Margarita Irun e Ana Ivanova (As Herdeiras)
MELHOR ATOR: Nestor Guzzini (Mi Mundial)
MELHOR ROTEIRO: Marcelo Martinessi (As Herdeiras)
MELHOR FOTOGRAFIA: Nelson Waisntein (Averno)
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI: Averno, de Marcos Loayza
MELHOR FILME – JÚRI POPULAR: As Herdeiras, de Marcelo Martinessi
MELHOR FILME – JÚRI DA CRÍTICA: As Herdeiras, de Marcelo Martinessi

CURTAS-METRAGENS BRASILEIROS

MELHOR FILME: Guaxuma, de Nara Normande
MELHOR DIREÇÃO: Fábio Rodrigo (Kairo)
MELHOR ATRIZ: Maria Tugira Cardoso, por Catadora de Gente
MELHOR ATOR: Manoel do Norte (A Retirada Para Um Coração Bruto)

MELHOR ROTEIRO: Marco Antônio Pereira (A Retirada Para Um Coração Bruto)
MELHOR DESENHO DE SOM: Fábio Carneiro Leão (Aquarela)
MELHOR TRILHA MUSICAL: Manoel do Norte (A Retirada Para Um Coração Bruto)
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE: Pedro Franz e Rafael Coutinho (Torre)
MELHOR MONTAGEM: Thiago Kistenmacker (Aquarela)
MELHOR FOTOGRAFIA: Beto Martins (Nova Iorque)
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI: Estamos Todos Aqui, de Chico Santos e Rafael Mellim
PRÊMIO CANAL BRASIL DE CURTAS: Nova Iorque, de Leo Tabosa
MELHOR FILME – JÚRI POPULAR: Torre, de Nádia Mangolini
MELHOR FILME – JÚRI DA CRÍTICA: Torre, de Nádia Mangolini

2 comentários em “46º Festival de Cinema de Gramado #8: balanço geral da premiação

  1. Não conheço “Ferrugem”. Sinceramente, achei que “Benzinho” iria ganhar a maior parte das categorias – e assim foi. De toda maneira, vou conferir o filme de Aly Muritiba na quinta, quando estreia por aqui.

    • Kamila, eu não só achava como esperava que “Benzinho” fosse ganhar como melhor filme. “Ferrugem” é um longa interessante, mas, ao meu ver, “Benzinho” merecia mais!

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