Rapidamente

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Deborah Secco e João Pedro Zappa em Boa Sorte: em seu primeiro longa-metragem, a diretora Carolina Jabor cumpre a difícil missão de encontrar beleza em uma circunstância essencialmente trágica.

BOA SORTE (idem, 2014, de Carolina Jabor): Não é fácil encontrar delicadeza em um universo essencialmente denso ou, então, beleza onde só existe tragédia. Mas Carolina Jabor encontrou e filmou o roteiro de Jorge e Pedro Furtado com uma segurança que está longe de indicar que a carioca está apenas em seu primeiro longa-metragem. Comove como Jabor dá luz a uma história de amor que, para o “bem” do próprio espectador, não deveria ser envolvente. Afinal, Judite (Deborah Secco) está internada pelo uso excessivo de drogas que lhe trouxe o HIV ao passo que João (João Pedro Zappa), ainda virgem e sem ter realmente vivido a sua vida, está enclausurado para se curar do vício por remédios. Como torcer sem medo para que duas pessoas criem laços em circunstâncias tão trágicas? Mesmo sabendo que existe a chance não vermos um final feliz vindo dessa situação, torcemos pelos personagens e mergulhamos nas distintas percepções que cada um tem do amor, do olhar inocentemente compulsivo de João frente ao primeiro amor à aproximação necessária mas cautelosa da calejada Judite. Com pequenas participações de luxo (Fernanda Montenegro e Cásia Kis Magro!), Boa Sorte encanta mesmo, apesar de eventuais escolhas fáceis para construir seu drama, pela dupla principal, em especial Deborah Secco, cada vez melhor atriz e totalmente entregue a sua difícil personagem.

CASA GRANDE (idem, 2014, de Fellipe Barbosa): Da “trilogia” sobre o cenário social brasileiro da era pós-Lula, Casa Grande deve ser o exemplar mais explicativo. Integrando o trio composto por O Som ao Redor e o recente Que Horas Ela Volta?, o longa de Fellipe Barbosa literalmente discute questões que o filme de Anna Muylaert, por exemplo, prefere ilustrar nas entrelinhas. Obviamente é uma questão de gosto, mas, para quem considera esta uma questão decisiva, Casa Grande pode não ser uma experiência necessariamente surpreendente. Ainda assim, o primeiro longa de ficção de Barbosa é contundente ao mostrar um Brasil individualista e que não consegue olhar para classes menos favorecidas com benevolência, respeito ou pelo menos consciência de que elas merecem ter tantas oportunidades quanto qualquer outra. É certo que o roteiro, escrito pelo próprio Barbosa em parceria com Karen Sztajnberg, opta por caminhos fáceis para suscitar tais questionamentos (óbvio que o protagonista branco de classe alta tem que se interessar sentimentalmente pela garota mulata e cotista). No entanto, a história é movimentada com fluidez, e o elenco é repleto de acertos e responsável pelos melhores momentos do filme. Se não é propriamente por sua execução, Casa Grande se torna obrigatório, claro, por sua alta relevância temática.

O PEQUENO PRÍNCIPE (The Little Prince, 2015, de Mark Osborne): Tem tido boa repercussão esta animação francesa que chegou a ser exibida em Cannes e que retoma o universo de um dos clássicos mais queridos da literatura. Lá se vão mais de 70 anos desde que Antoine de Saint-Exupéry lançou O Pequeno Príncipe, mas o livro segue conquistando gerações. Entretanto, quem pensa que a animação comandada por Mark Osborne aborda exclusivamente o personagem-título pode se decepcionar. Isso porque o filme prefere contar a história dele sob a perspectiva de uma garotinha que está estudando para um importante teste acadêmico ao mesmo tempo que precisa viver dentro das regras de uma mãe extremamente controladora. Só que toda a parte de O Pequeno Príncipe envolvendo a menina é infinitamente menos interessante do que as passagens envolvendo o célebre personagem, e o problema não se estende apenas ao ritmo da história, mas também ao próprio visual: a delicadeza de uma animação de papel no universo do Príncipe é mais encantadora do que a construção digital da outra protagonista. Outro tropeço é que O Pequeno Príncipe inventa demais e chega a mostrar o adorável personagem já adolescente, o que pode abalar o imaginário de gerações que se encantaram com a consagrada história. 

2 comentários em “Rapidamente

  1. Gostei muito de “Casa Grande” e de toda a sua proposta (principalmente a discussão sobre as cotas nas universidades brasileiras).

    “Boa Sorte” é um filme bacana, mas é Deborah Secco quem segura o rojão e se torna inesquecível. Já que o filme como um todo não se sustenta tão bem.

    Já “O Pequeno Príncipe”: quem sabe um dia, né? rs

    Abraços. ;)

    • Alan, eu também acho que a Deborah Secco é maior que “Boa Sorte”, mas acho o filme muito bem resolvido e até mesmo emocionante em seu final!

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