A Cabana

Love always leaves a mark.

Direção: Stuart Hazeldine

Roteiro: Andrew Lanham, Destin Daniel Cretton e John Fusco, baseado no livro homônimo de William P. Young

Elenco: Sam Worthington, Octavia Spencer, Avraham Aviv Alush, Sumire Matsubara, Tim McGraw, Radha Mitchell, Alice Braga, Megan Charpentier, Gage Munroe, Amélie Eve, Graham Greene, Ryan Robbins

The Shack, EUA, Drama, 2017, 132 minutos

Sinopse: Um homem vive atormentado após perder a sua filha mais nova, cujo corpo nunca foi encontrado, mas sinais de que ela teria sido violentada e assassinada são encontrados em uma cabana nas montanhas. Anos depois da tragédia, ele recebe um chamado misterioso para retornar a esse local, onde ele vai receber uma lição de vida. (Adoro Cinema)

Se já é fácil ser impaciente e intolerante com filmes que apresentam histórias baseadas em valores e princípios distantes dos nossos, o que sobra, então, para aqueles que, além disso, repetem as mesmas fórmulas panfletárias e unidimensionais de outras obras ruins e de mesma proposta? Praticamente nada. É aí que se encaixa A Cabana, que, baseado no best seller homônimo de William P. Young, filosofa sobre nossa existência com um pano de fundo religioso repleto de representações batidas e dignas de um programa televisivo de auto-ajuda. Uma coisa é se deparar com isso em uma livraria, onde podemos ignorar a obra na primeira leitura da sinopse. Outra é investir tempo, dinheiro e boa vontade no cinema, esperando que um filme nos surpreenda ao quebrar qualquer preconceito que tenhamos com ele. Não é questão do que se discute em termos de conteúdo, e sim de execução, pois, quando se constata que A Cabana traz, pela milésima vez, entidades divinas vestidas de branco em um lindo jardim florido, ensolarado e cheio de borboletas, qualquer boa vontade em esperar algum exercício cinematográfico na obra vai por água abaixo.

Dirigido por Stuart Hazeldine, A Cabana opta pelo drama fácil sempre que possível, o que é um claro reflexo do seu material de origem, que, não há dúvidas, tornou-se um grande sucesso editorial por justamente não poupar esforços para comover o maior número de leitores. E, no cinema, onde palavras precisam ser transpostas para figurinos, trilhas sonoras, cenários e outros setores, a situação se torna mais atraente para quem curte a pegada e, claro, mais difícil para quem rejeita o formato. Não bastasse trazer o batido arco da família perfeita de comercial de margarina que, um belo dia, tem sua vida colocada de pernas para o ar por uma tragédia, A Cabana centra quase toda sua história em uma viagem motivacional onde o patriarca Mack (Sam Worthington), incapaz de superar a perda de um ente querido, passa um fim de semana transformador com Deus, Jesus e Espírito Santo. De vez em quando, ele ainda esbarra com figuras como a Sabedoria (sim, a virtude, vivida por Alice Braga), que, também vestida de branco e com um semblante extremamente acolhedor, ensinará o que ele precisa rever em sua vida para se recompor, voltar para casa e reunificar a família.

É fundamental não julgar o que A Cabana quer deixar de mensagem, mas sim como ele deixa que isso chegue ao espectador. Expositivo (a cena da Sabedoria não dispensa flashbacks para retomar acontecimentos já encenados), o fim de semana do protagonista junto a figuras divinas é tedioso porque não passa de um amontoado de conversas onde ele será persuadido a reavaliar muitas de suas ideias. Entre uma prosa e outra, Mack também corre pelas águas assumindo os poderes de Jesus Cristo, como se o filme tentasse fazer alguma graça para movimentar um relato que visivelmente não consegue ir além do trabalho verbal. Sem as longas cenas de reflexões onde Mack, afundado em tristezas, esbraveja para Deus que seu amor é seletivo ao permitir que pessoas morram diariamente de forma injusta no mundo, A Cabana é estático e, pior ainda, limitado nas associações visuais que faz em relação aos sentimentos do personagem e às diferentes fases vividas por ele ao longo da trama. Basta perceber como os momentos em que Mack passa por algum sofrimento possuem estilizações simplórias (as surras que leva do pai alcoolizado na infância, por exemplo, são encenadas de forma estridente em uma noite chuvosa e cheia de trovões), problema que é repetido nas sequências em que ele recebe algum alento (a primeira longa conversa com Deus acontece em uma cozinha aconchegante com um brilhante feixe de luz atravessando a janela). São construções óbvias, previsíveis e já usadas à exaustão em outros filmes. Daí vem a impaciência com A Cabana.

Muito dos defeitos e das simplificações do longa poderiam ser relevados se um ator de grande talento tivesse uma forte presença em cena. Não é o caso de Sam Worthington, que, além de não ter talento ou expressiva (até em Avatar ele era perfeitamente esquecível), torna A Cabana uma viagem ainda mais ingrata por não fazer com que o espectador tenha qualquer conexão com seu personagem. A história vivida por ele é triste, claro, mas não há texto que garanta emoção quando um intérprete precisa visivelmente se esforçar até para derramar uma lágrima. É um problema tremendo (talvez o maior) para um filme que, por outro lado, consegue ser um veículo de exercício para Octavia Spencer. Ela, que vem diminuindo a marcha de suas caricaturas em filmes como Estrelas Além do Tempo, está novamente humana e devidamente acalantadora ao assumir a responsabilidade de incorporar Deus. Inclusive, é muito bacana a diversidade encontrada na representação das figuras divinas, onde Deus, Jesus e Espírito Santo são interpretados por atores negros, árabes e orientais, respectivamente. Contudo, é mera questão de tempo para que A Cabana volte a repetir suas fórmulas e melodramas, perdendo a chance de ser o filme que poderia, pelo menos, fazer com que boa parte da plateia repensasse o preconceito que nutre por produções baseadas em best sellers de auto-ajuda.

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