The greatest sins in human history were committed in the name of love.
Direção: Ron Howard
Roteiro: David Koepp, baseado no livro homônimo de Dan Brown
Elenco: Tom Hanks, Felicity Jones, Ben Foster, Omar Sy, Irrfan Khan, Sidse Babett Knudsen, Ana Ularu, Ida Darvish, Jon Donahue, Christian Stelluti, Francesca Inaudi, Attila Árpa
EUA/Japão/Turquia/Hungria, 2016, Ação, 121 minutos
Sinopse: Florença, Itália. Robert Langdon (Tom Hanks) desperta em um hospital, com um ferimento na cabeça provocado por um tiro de raspão. Bastante grogue, ele é tratado por Sienna Brooks (Felicity Jones), uma médica que o conheceu quando ainda era criança. Langdon não se lembra de absolutamente nada que lhe aconteceu nas últimas 48 horas, nem mesmo o porquê de estar em Florença. Subitamente, ele é atacado por uma mulher misteriosa e, com a ajuda de Sienna, escapa do local. Ela o leva até sua casa, onde trata de seu ferimento. Lá Langdon percebe que em seu paletó está um frasco lacrado, que apenas pode ser aberto com sua impressão digital. Nele, há um estranho artefato que dá início a uma busca incessante através do universo de Dante Alighieri, autor de “A Divina Comédia”, de forma a que possa entender não apenas o que lhe aconteceu, mas também o porquê de ser perseguido. (Adoro Cinema)
James Bond da História, das artes e da religião, Robert Langdon (Tom Hanks) veio ao mundo em 2000, quando o escritor norte-americano Dan Brown lançou Anjos e Demônios, seu segundo livro após o divertido Fortaleza Digital. Nas páginas, o famoso simbologista de Harvard, no entanto, só virou febre três anos depois, quando O Código Da Vinci ganhou as livrarias e começou a ser traduzido para mais de 50 idiomas com polêmicas envolvendo teorias religiosas como aquela em que Brown versa sobre Jesus Cristo ter sido casado com Maria Madalena. De escrita simples, mas incrivelmente funcional para uma leitura leve, cheia de pesquisa e com tino para entretenimento, o escritor, apesar de outras obras protagonizadas por diferentes personagens como Ponto de Impacto e O Símbolo Perdido, volta e meia recorre a Robert Langdon, sujeito que, sempre com um emblemático relógio do Mickey no pulso, costuma salvar o mundo ao substituir armas e disputas físicas por inteligência na hora de desvendar as mais diversas e perigosas charadas históricas. Ou seja, Langdon pode até não ser um agente 00 a serviço do sistema de espionagem britânico, mas a concepção de suas histórias muito se assemelha ao que James Bond vive na literatura e no cinema: viagens internacionais, conspirações, corriqueiras perseguições e alguns interesses amorosos no caminho.
A proposta de Dan Brown virou febre (com toda razão), trazendo ao escritor uma carreira prolífera e duradoura que também se reflete nas 200 milhões de cópias vendidas ao redor do mundo a partir dos cinco livros lançados por ele desde Anjos e Demônios – e mais um já está a caminho para aumentar a cifra: Origin, previsto para 2017 e novamente protagonizado por Langdon. Já no cinema, mesmo com significativos trocados no caixa, a situação já é bem diferente. Com apenas três filmes em dez anos (esse espaçamento é complicado, uma vez que hoje Dan Brown já não goza da mesma influência e do fator novidade de antes), a saga do personagem na tela grande nunca chegou perto de alcançar a mesma força das discussões levantadas pelos livros ou até o mesmo senso de entretenimento deles. Gosto mais de O Código Da Vinci do que a média, mas reconheço que a direção tradicional de Ron Howard academiza toda e qualquer discussão, o que deixa a experiência para lá de didática. Já em Anjos e Demônios, que desaprovo mais do que a maioria, Howard tentou dar mais lugar à ação, mas pesando muito a mão ao transformar o Vaticano no lugar mais inverossímil e cheio de caos do planeta.
E, agora, chegamos a Inferno. Todo essa retrospectiva é importante para considerarmos o amontoado de obstáculos que uma nova aventura baseada no universo de Dan Brown precisa enfrentar, como a literatura agora menos expressiva de seu autor, o histórico nada favorável de críticas à saga no cinema e o fato de que o formato já conhecido das aventuras segue sob a tutela de Ron Howard, diretor, que, julgando pelos filmes anteriores, não encontrou o tom certo para as adaptações. Ainda há espaço e paciência para filmes dessa natureza? Sim e não. Inferno é, sem dúvida alguma, o trabalho mais bem resolvido em termos de personalidade quando comparado a O Código Da Vinci e Anjos e Demônios. Entretanto, fica evidente o problema da equipe em não conseguir solucionar problemas básicos de adaptação mesmo com a troca de roteirista (sai Akiva Goldsman, entra David Koepp). E o maior deles é novamente faltar fluidez na transição entre cenas altamente expositivas e a ação, já que, enquanto a correria desenfreada dilui todas as explicações e referências dos personagens, o conteúdo apresentado por eles nunca parece suficientemente crível para movimentar tantos conflitos.
Talentoso roteirista, Koepp, que escreveu de Jurassic Park: O Parque dos Dinossauros a Missão: Impossível deixa a impressão de que está no piloto automático ao adaptar as exposições do livro, o que contamina o filme como um todo. É particularmente preguiçosa a forma como o protagonista precisa explicar tudo ao espectador até mesmo na hora da correria, onde frequentemente narra a ação ao dizer coisas como “agora nós vamos descer essa escada, atravessar uma ponte, entrar na porta à direita e chegar a uma sala onde estaremos a salvo”. Não é mais interessante simplesmente mostrar essa ação? O curioso é que, por mais que seja eventualmente esquemática, a entrada de Koepp é o que torna Inferno um entretenimento mais palatável do que os filmes anteriores. Por ter assinado o roteiro de icônicos filmes de aventura, ele compreende o poder do entretenimento, fazendo de Inferno uma experiência dinâmica e frequentemente divertida. Ajudam, claro, as lindas locações italianas devidamente aproveitadas por Ron Howard e as boas ideias do material original, em especial uma reviravolta que acontece no terço final e que compensa momentos que até então pareciam descuidos da história. Se o longa termina como um bom passatempo, isso é mérito quase todo de Koepp, que consegue disfarçar até o fato de Tom Hanks já não ter mais o físico para correr e lutar tanto como um Daniel Craig da vida.
Compensando, Hanks mais uma vez empresta simpatia e naturalidade ao protagonista, que, dessa vez, está acompanhado de Felicity Jones como sua bondgirl. Se a jovem atriz britânica ainda precisa mostrar ao que veio após uma esquecível indicação ao Oscar de melhor atriz por A Teoria de Tudo, o elenco de suporte dá uma base sólida ao grupo de atores de Inferno. Trazendo nomes mais conhecidos como o indiano Irrfan Khan, o francês Omar Sy e o estadunidense Ben Foster, os coadjuvantes do longa empregam credibilidade à experiência mesmo em papeis que, caso melhor explorados, só teriam a agregar aos dramas pessoais que faltam ao filme, a exemplo da Elizabeth Sinskey de Sidse Babett Knudsen, que é muito boa como uma antiga história de amor mal resolvida do protagonista. De resto, passada uma década desde o lançamento de O Código Da Vinci, é possível constatar que pouco evoluiu no cinema baseado na obra de Dan Brown, o que não deixa de nos levar à teoria de que, talvez, assim como a literatura do escritor, o momento desse formato também já tenha passado no cinema. A diversão está mais presente, é verdade, mas o investimento é grande demais (em escala de produção, em orçamento e em aplicação de tempo e dedicação dos envolvidos) para ser somente isso.