Na TV… a lenta linhagem familiar de “Bloodline”

O filho problemático volta ao lar: “Bloodline”, nova série produzida Netflix, só é verdadeiramente envolvente quando se foca nos meandros de antigas feridas familiares.

Mesmo com uma boa equipe, Bloodline foi um dos lançamentos de menor repercussão da prolífera Netflix. A criação do seriado ficou por conta do trio Glenn Kessler, Todd A. Kessler e Daniel Zelman, os mesmos responsáveis por Damages, celebrado drama jurídico que trouxe uma nova era de ouro para a carreira de Glenn Close em 2007. No elenco ainda estão nomes como Kyle Chandler, protagonista da queridinha Friday Night Lights, e Sissy Spacek, vencedora do Oscar que dispensa apresentações. Mas a estreia do programa foi tímida e seu esquecimento em tempos tão movimentados no mundo das séries é compreensível: ao longo de 13 episódios, não há dúvidas de que este é um drama convencional em todos os sentidos – e que ainda comete o erro de prolongar excessivamente os seus lugares comuns.

Os irmãos Kessler em parceria com Daniel Zelman idealizaram Bloodline com a mesma lógica estrutural de Damages: um futuro bombástico é pincelado por flashforwards, e cabe ao espectador tentar adivinhar quais fatos do presente acarretarão eventos tão surpreendentes. Se o seriado estrelado por Glenn Close foi de certa forma pioneiro nesse tipo de narrativa na TV, hoje a escolha já se mostra ultrapassada. Isso porque são incontáveis os programas que utilizam tal estrutura para prender o espectador (How to Get Away With Murder True Detective são alguns dos exemplares mais recentes). O que se revela problemático, entretanto, é que, em tramas como as dos seriados citados, o vai e vem da história é perfeitamente compreensível dada a natureza de suspense dos conflitos. Já em Bloodline a escolha é ineficiente, pois este é um drama que não é necessariamente misterioso em sua essência. 

Neste caso, revelar cedo demais um importante fato do futuro estraga o impacto que ele teria com uma narrativa linear. Prometer demais nunca é bom, pois pode ser que o desenvolvimento até lá não seja necessariamente engenhoso. É o que acontece com Bloodline que, ao invés de construir uma trama complexa como Damages ou True Detective, apenas se prolonga em fatos e situações comuns desnecessariamente. Além disso, reúne diversos estereótipos de um relato familiar, como o filho rejeitado que foi embora e agora está de volta, a mãe que nunca teve personalidade frente ao marido e o primogênito responsável que é o porto seguro do clã. Só quem tem paciência sobrevive aos longos episódios (seja pela duração de uma hora ou pela própria condução), e é difícil chegar ao fim de uma série que não surpreende dramaticamente. São muitos rodeios para, no final das contas, descobrirmos o que já facilmente deduzíamos.

bloodlineseriestwo

Enquanto Ben Mendehlson toma a série inteira para si, Kyle Chandler e Linda Cardellini só se destacam de fato nos momentos derradeiros da primeira temporada.

No ritmo arrastado de Bloodline, pouco se desenvolve de precioso sobre a personalidade dos personagens – todos bem definidos já em poucos episódios. Por outro lado, um deles se mantem intacto ao longo de toda a temporada: o misterioso Danny, vivido com grande talento por Ben Mendehlson. A série sabe conduzir toda a dubiedade do rejeitado caçula, um sujeito que frequentemente desorienta nosso senso de confiança: ele vai de alguém digno de segunda chance a homem detestável em questão de minutos. Mendehlson é tudo o que Damian Lewis, por exemplo, não era em Homeland. Ou seja, um ator sutil e eficiente ao seduzir o espectador para minutos depois também afastá-lo. Assim, não é à toa que os melhores episódios da temporada são as partes 11 e 12, onde todos os acontecimentos e questionamentos são movidos em função quase exclusivamente dele. Todos são críveis no elenco de Bloodline, mas Mendehlson é indiscutivelmente o mais beneficiado.

Tudo o que envolve o ator representa o que existe de melhor no seriado, especialmente as discussões envolvendo mágoas familiares guardadas por anos. Essa abordagem não é novidade, mas sempre que são despertados antigos problemas entre o clã dos Rayburn, Bloodline dá chances maiores aos seus atores e ganha novo fôlego. Quando o Danny de Mendehlson, então, é o catalisador de todos os conflitos, a série chega a quase compensar toda a inércia de suas partes arrastadas. Neste primeiro ano um ciclo é completado e pouco existe em vista para uma já confirmada segunda temporada. Sempre considero um problema quando um programa encerra basicamente toda a sua premissa logo de cara, deixando apenas cliffhangers até mesmo forçados para que a história continue rendendo posteriormente (aqui temos a velha jogada de um personagem cuja existência nos era desconhecida aparece de surpresa na última cena) e, dado o fato de que neste primeiro ano de Bloodline, a história em si já não era rica para tantos prolongamentos, o futuro não deslumbra momentos mais especiais para o programa. Tomara que provem o contrário.

Um comentário em “Na TV… a lenta linhagem familiar de “Bloodline”

  1. O Netflix tem se destacado na produção de seriados de TV e “Bloodline” é um exemplo disso. Um grande elenco a série tem!

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