
Além da ótima presença de Tilda Swinton, Expresso do Amanhã se destaca pelo criativo design de produção e pelas ideias que escapam das previsibilidades de boa parte dos filmes de ficção
UMA AVENTURA LEGO (The Lego Movie, 2014, de Christopher Miller e Phil Lord): Conquistou uma legião de fãs esse filme que, para mim, resultou em uma grande dor de cabeça. Gosto do humor e das várias referências que a dupla Christopher Miller e Phil Lord trouxe para o ótimo visual do mundo Lego, mas construir um filme somente em cima dessas piadas não é, ao contrário do que pode parecer, uma jogada inteligente. O grande problema de Uma Aventura Lego é que, fora o humor subversivo e a imensa gama de personagens, situações e histórias referenciadas aqui, não existe uma trama consistente. Por isso, a animação parece ter o dobro da duração que realmente tem, se arrastando em uma jornada infinita de situações desconexas e histriônicas. Em cinco minutos, é possível ir de um submarino ao México, de Cleópatra a Batman – algo que resultaria genial em um filme que tivesse pensado em uma história realmente boa antes. Aqui, as divertidas aparições desses personagens e a construção de situações inimagináveis soam mais como um artifício forçado para conquistar a galera geek. De lembrança mesmo fica apenas o visual e Everything is Awesome, a canção mais divertidamente grudenta em sabe-se lá quantos anos.
EXPRESSO DO AMANHÃ (Snowpiercer, 2013, de Bong Joon Ho): Estreia do diretor coreano Bong Joon Ho (O Hospedeiro e Mother) em um filme falando em inglês, Expresso do Amanhã é baseado na HQ francesa Le Transperceneige, que traz uma trama similar ao de José Saramago em Ensaio Sobre a Cegueira, por exemplo: uma comunidade sendo construída em uma circunstância extraordinária onde pessoas são isoladas por uma força maior. No caso do filme de Joon Ho, um enorme trem, que abriga os últimos sobreviventes de uma catástrofe climática que congelou o mundo. Fora as discussões envolvendo rebelião e construção de um novo modelo de sociedade, Expresso do Amanhã também é uma boa ficção, bastante gráfica e conceitual. Não é uma experiência fácil (aqui inexistem as previsibilidades do gênero, com personagens importantes morrendo ao longo da trama e referências bastante espertas, a exemplo da tirana antagonista vivida por Tilda Swinton que usa os mesmos óculos de Margaret Thatcher!). Enquanto até a metade o longa parece mais um (interessante) videogame em que os personagens precisam apenas avançar nos perigos de cada vagão do trem, logo a história traz uma reviravolta (com uma ótima sequência protagonizada por Alison Pill) e tudo ganha outra dimensão. Vale ressaltar ainda o excelente design de produção e a sensacional criação de Tilda Swinton como a ministra Mason. Se Oscar conta alguma coisa, são duas faltas bastante sentidas na cerimônia de 2015.
MESMO SE NADA DER CERTO (Begin Again, 2013, de John Carney): O diretor irlandês John Carney gosta mesmo de usar a música para falar sobre sentimentos. Mas, se em Apenas Uma Vez, o clima era incrivelmente melancólico, a situação já é diferente em Mesmo Se Nada Der Certo, uma produção bastante espirituosa. A lógica é a mesma: personagens com vidas pessoais bagunçadas ou despedaças encontram na música uma razão para esquecer os problemas e seguir em frente. Comparado ao filme anterior do diretor, este novo trabalho é menos inspirado, com canções agradáveis mas não tão fundamentais à construção da narrativa e um tanto repetitivo na mensagem que Carney parece querer seguir em longas com sua assinatura. Mark Ruffalo e Keira Knightley, a dupla protagonista, são o ponto alto da história, com destaque para ela, que, em seus últimos trabalhos, finalmente aprendeu a deixar as caras e bocas de lado. Alguns descuidos na história são perceptíveis (como o personagem de Ruffalo está quase falido e desabrigado se tem um grande amigo que diz dever sua fortuna de milhões a ele?), mas a boa vibe do filme compensa. Agradável aos ouvidos e à alma, Mesmo Se Nada Der Certo funciona facilmente como uma diversão despretensiosa.
A OUTRA TERRA (Another Earth, 2011, de Mike Cahill): Chegou a vencer o prêmio especial do júri em Sundance esse filme de estreia de Mike Cahill no universo de tramas de ficção (antes ele havia dirigido o documentário Boxers and Ballerinas). Cahill trabalhou em parceria com Brit Marling, a jovem protagonista que também escreveu o roteiro e produziu o longa com ele. Enigmático e bastante envolvente, A Outra Terra traz uma garota atormentada por uma tragédia pessoal que testemunha a descoberta de um novo planeta habitados por seres humanos com identidades iguais às nossas. Contudo, não pense que esta é uma trama de ficção no sentido clássico do gênero ou um suspense envolvendo alienígenas e coisas do gênero. Na realidade, toda a descoberta do outro planeta e a possibilidade de realmente ainda termos muito o que descobrir nesse vasto universo servem para ajudar a moldar a própria trajetória da protagonista em busca de redenção e algum tipo de paz. O final surpreendente, o roteiro bem lapidado dramaticamente e a simplicidade realista de uma produção alternativa fazem de A Outra Terra uma experiência interessantíssima e envolvente para quem procura obras que escapem de conceitos fáceis.
“just tell me if you wanna go homee…” ♥ mais keira moderninhaaa!