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Praia do Futuro é um dos filmes mais difíceis do ano, mas também um dos mais recompensadores para quem conseguir embarcar na proposta do diretor Karim Aïnouz

Praia do Futuro é um dos filmes mais difíceis do ano, mas também um dos mais recompensadores para quem embarca na proposta do diretor Karim Aïnouz

A 100 PASSOS DE UM SONHO (The Hundred-Foot Journey, de Lasse Hallström): O sueco Lasse Hallström, ao contrário do que as premiações já celebraram, nunca foi um grande diretor, mas é verdade que ele tem capacidade de fazer coisas muito melhores do que esse A 100 Passos de Um Sonho. Ok, o filme estrelado por Helen Mirren (indicada ao Globo de Ouro 2015 de atriz comédia/musical por seu trabalho aqui só para completar a fraca lista) é leve e inofensivo, só que não custava o roteiro ser pelo menos um pouquinho mais original. Previsível do início ao fim, o longa de Hallström cai no velho clichê da família indiana que muda de país sem nada na bagagem além de sonhos, boas intenções e um filho primogênito cheio de talento para culinária. Na França, eles se instalam frente ao restaurante de uma mulher rica que, após a morte do marido, controla os negócios com mãos de ferro e, claro, não deseja que ninguém ameace o seu negócio. Só que a família indiana, claro, vai movimentar as águas do local e, principalmente, a vida da tal senhora. O ritmo por si só já é arrastado e o fato de A 100 Passos de Um Sonho seguir todos os passos da cartilha de um filme com essa premissa não ajuda. Hallström não chega a abusar da paciência do espectador com grandes melodramas ou forçações de barra como em outros filmes que já realizou, mas bem que poderia, pelo menos, mostrar que ainda tem um pouquinho das habilidades que anos atrás lhe trouxeram tanto prestígio. Isto porque o Hallström de Regras da VidaChegadas e PartidasChocolate pode até ser subestimado, mas é, sem dúvida, melhor do que esse nada inspirado de Querido JohnAmor Impossível e, agora, A 100 Passos de Um Sonho.

PRAIA DO FUTURO (idem, de Karim Aïnouz): Só mesmo a desinformação – aliada ao conservadorismo – fez com que pessoas assistissem a Praia do Futuro e pedissem o ingresso de volta em função das cenas de sexo gay. Até porque basta investigar um pouco a filmografia de Karim Aïnouz para deduzir que este seu novo filme tinha grandes chances de não ser uma experiência fácil ou comercial. E de fato não é. Para muito além das cenas de sexo envolvendo dois homens (que estão longe de ser o escândalo apontado por aí), Praia do Futuro é um filme bastante lento e complexo – mas também um dos mais recompensadores que o cinema brasileiro entregou em 2014. Wagner Moura está especialmente bem aqui, distanciando-se um pouco do cinema mais acessível que tem cercado suas últimas escolhas. Ele enfrenta um dos personagens mais desafiadores de sua recente carreira, e, como o grande ator que é, não desaponta. O filme em si é estruturado em três capítulos, todos separados por avanços no tempo. Isso não quer dizer, porém, que Praia do Futuro seja um filme sobre grandes acontecimentos ou mudanças que se intercalam em cada um deles. Pelo contrário. Todas as transformações dos personagens acontecem de forma sutil e silenciosa – o que faz com que o resultado seja para um público bem específico. Entretanto, mesmo entre quem supostamente gostaria, Praia do Futuro não foi muito bem sucedido. Ao mesmo tempo em que a reação seja de certa forma compreensível, também era de se esperar maior boa vontade com o filme, que tem diversos méritos inegáveis (a cena final é um deles, permanecendo com o espectador durante um bom tempo).

YVES SAINT-LAURENT (idem, de Jalil Lespert): Antes de Saint-Laurent estrear na competição de Cannes trazendo os galãs Gaspard Ulliel e Louis Garrel no elenco, o mundo já havia conferido – também em 2014 – outra cinebiografia do famoso estilista francês. Yves-Saint Laurent chegou ao Brasil, por exemplo, bem antes, ainda que seja uma produção idealizada após as tratativas do filme com Ulliel e Garrel. Certamente fizeram uma corrida para ver quem chegaria aos cinemas primeiro e se este longa dirigido por Lespert achou que apressar o calendário para estrear antes era sinônimo de sucesso, o tiro saiu pela culatra. Isto porque Yves Saint Laurent passou timidamente pelos cinemas e foi definido apenas como uma biografia convencional e pouco ousada. De fato, o filme protagonizado por um satisfatório Pierre Niney acerta no diálogo entre elegância e simplicidade de visual, mas não é nada consistente na parte em que precisa desenvolver a vida conturbada de Laurent. Se a transição de um menino talentoso mas jovem demais e inseguro para um verdadeiro ícone da moda funciona, sua vida após não chega a ser bem desenvolvida em termos dramáticas. A tardia libertação pessoal e sexual de um homem que assumiu responsabilidades muito cedo não ganha a devida profundidade dramática – e, neste sentido, a breve duração de 105 minutos é um problema pois deixa a sensação de que Yves Saint-Laurent poderia se estender mais um pouco para dar detalhes que fazem muita falta. Não chega a ser animador ter que ver outra biografia de Laurent futuramente (a versão protagonizada por Ulliel já passou rapidamente por aqui recentemente), mas, dada a incompletude do filme de Lespert em seu terço final, talvez seja uma chance de entender melhor a vida do icônico estilista.

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