
Os vencedores da festa quase impecável de encerramento do 42º Festival de Cinema de Gramado. Foto: Dani Villar/Pressphoto
Já comentei algumas vezes por aqui que não sei o que acontece com os júris de Gramado. Ano após ano eles mudam e a reforma agrária continua. Parece que existe uma certa obrigação de agradar a todos. Essa ideia de que todo filme tem que sair com pelo menos um Kikito é tola e contraprodutiva, castrando a autenticidade do evento. Neste ano, a caridade até que não incomodou tanto, mas aí anunciaram o vencedor da última categoria, cuja vitória é, possivelmente, o maior absurdo dos últimos anos.
Sabe-se lá o porquê do júri ter escolhido A Estrada 47 como o melhor de 2014, já que o filme de Vicente Ferraz foi o que menos repercutiu entre público e imprensa. Ninguém o considerava para a categoria principal. Como disse Roberto Guerra, do Cineclick, é como se a sua festa ganhasse o prêmio de melhor festa do ano sem ter vencido nas categorias de melhor DJ, melhor buffet, melhor recepção, melhor infraestrutura, etc. Você é a melhor festa, mas não é melhor que ninguém em nenhum quesito específico.
Reitero essa comparação porque A Estrada 47, além do prêmio de melhor filme, só conquistou a mísera categoria de desenho de som, enquanto A Despedida saiu da festa com quatro prêmios (direção, ator, atriz e fotografia) e Infância também (roteiro, ator coadjuvante, montagem e prêmio especial do júri). Sendo bem sincero, foi feio o júri de Gramado ter contrariado a unanimidade de A Despedida, que deve ser o filme mais elogiado por público e crítica das últimas edições. Ou, então, ter escanteado Fernanda Montenegro para um Kikito especial afim de não ter que justificar sua derrota para Juliana Paes na categoria de melhor atriz.
Se não fosse A Despedida – o meu favorito da mostra -, que premiassem, então, o criativo e ousado Sinfonia da Necrópole, que conquistou pelo menos o prêmio de melhor filme pelo júri da crítica. Tudo estava bem encaminhado até a última categoria, especialmente porque Nelson Xavier e Juliana Paes foram devidamente premiados e até o eficiente O Segredo dos Diamantes faturou o prêmio de júri popular. Entre os latinos, nenhuma surpresa ver El Lugar Del Hijo como grande vencedor. É um típico filme de festival (no sentido pejorativo e antiquado da comparação).
Só é realmente uma pena que o júri tenha ateado fogo ao evento nos 45 do segundo tempo escolhendo um filme pouco comentado e elogiado. Esta edição não será lembrada em função de A Estrada 47. Foram tantos os filmes bons e diversificados exibidos ao longo da semana que fica até estranho uma produção de guerra já exibida no Festival do Rio ter sido coroada como a melhor da mostra. O evento em si foi muito agradecido no palco, onde o próprio Nelson Xavier elogiou o alto nível dos filmes e a excelente organização do Festival. Lamentável, portanto, que a última escolha, a mais importante de todas, não simbolize o que foi o evento em 2014. E, como em um filme, sabemos que o final pode estragar a festa e deixar uma má impressão de todo o conjunto. Foi exatamente o que aconteceu.
Confira a lista de vencedores:
LONGAS-METRAGENS BRASILEIROS
MELHOR FILME: A Estrada 47, de Vicente Ferraz
MELHOR DIREÇÃO: Marcelo Galvão (A Despedida)
MELHOR ATOR: Nelson Xavier (A Despedida)
MELHOR ATRIZ: Juliana Paes (A Despedida)
MELHOR DESENHO DE SOM: A Estrada 47
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE: Andrea Buzato (Os Senhores da Guerra)
MELHOR ATOR COADJUVANTE: Paulo Betti (Infância)
MELHOR TRILHA MUSICAL: A Luneta do Tempo
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE: A Luneta do Tempo
MELHOR MONTAGEM: Infância
MELHOR FOTOGRAFIA: A Despedida
MELHOR ROTEIRO: Infância
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI (1): Os Senhores da Guerra, de Tabajara Ruas
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI (2): Fernanda Montenegro (Infância)
MELHOR FILME (Júri Popular): O Segredo dos Diamantes, de Helvécio Ratton
LONGAS-METRAGENS LATINOS
MELHOR FILME: El Lugar Del Hijo, de Manuel Nieto
MELHOR DIREÇÃO: Moisés Sepúlveda (Las Analfabetas)
MELHOR FOTOGRAFIA: Las Analfabetas
MELHOR ROTEIRO: El Lugar Del Hijo
MELHOR ATRIZ: Paulina Garcia e Valentina Muhr (Las Analfabetas)
MELHOR ATOR: Felipe Dieste (El Lugar Del Hijo)
MELHOR FILME (Júri Popular): Esclavo de Dios, de Joel Novoa
MELHOR FILME (Júri da Crítica): El Crítico, de Hernán Guerschuny
CURTAS-METRAGENS BRASILEIROS
MELHOR FILME: Se Essa Lua Fosse Minha, de Larissa Lewandowski
MELHOR DIREÇÃO: Gustavo Vinagre (La Llamada)
MELHOR ATRIZ: Rafaela Souza (Carranca)
MELHOR ATOR: Guilherme Silva (Carranca)
MELHOR DESENHO DE SOM: História Natural
MELHOR TRILHA MUSICAL: Sem Título #1: Dance of Leitfossil
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE: O Coração do Príncipe
MELHOR MONTAGEM: Sem Título #1: Dance of Leitfossil
MELHOR FOTOGRAFIA: La Llamada
MELHOR ROTEIRO: O Coração do Príncipe
PRÊMIO ESPECIAL DO JÚRI: O Clube, de Allan Ribeiro
MELHOR FILME (Júri Popular): A Pequena Vendedora de Fósforos, de Kyoko Yamashita
MELHOR FILME (Júri da Crítica): La Llamada, de Gustavo Vinagre
PRÊMIO CANAL BRASIL: A Pequena Vendedora de Fósforos, de Kyoko Yamashita
PRÊMIO DOM QUIXOTE: Las Analfabetas, de Moisés Sepúlveda
Kamila, é uma pena que seja assim, pois “A Despedida” merecia, sem exageros, levar todos os prêmios possíveis. E ninguém esperava que “A Estrada 47” fosse vencer qualquer categoria principal.
Pelas reações, eu achava que “A Despedida” iria monopolizar a premiação do Festival de Cinema de Gramado, mas esse negócio de dividir os prêmios entre diversos filmes, sem monopolizações, é uma tendência recente desses shows de premiação. Eles querem mesmo é espalhar a riqueza.
Parabéns, Matheus, pela excelente cobertura do Festival de Cinema de Gramado 2014.