You are nothing to me until you’re everything.
Direção: David O. Rusell
Roteiro: Eric Warren Singer e David O. Russell
Elenco: Christian Bale, Amy Adams, Jennifer Lawrence, Bradley Cooper, Jeremy Renner, Louis C.K., Jack Huston, Michael Peña, Shea Whigham, Alessandro Nivola, Elisabeth Röhm, Paul Herman, Saïd Taghmaoui
American Hustle, EUA, 2013, Comédia, 138 minutos
Sinopse: Irving Rosenfeld (Christian Bale) é um grande trapaceiro, que trabalha junto da sócia e amante Sydney Prosser (Amy Adams). Os dois são forçados a colaborar com um agente do FBI (Bradley Cooper), infiltrando o perigoso e sedutor mundo da máfia. Ao mesmo tempo, o trio se envolve na política do país, através do candidato Carmine Polito (Jeremy Renner). Os planos parecem dar certo, até a esposa de Irving, Rosalyn (Jennifer Lawrence), aparecer e mudar as regras do jogo. (Adoro Cinema)
Se existe uma qualidade inegável na filmografia de David O. Rusell, essa é a sua notável habilidade em dirigir atores. Desde quando debutou na direção de longas-metragens em 1996 com Procurando Encrenca, já conseguiu reunir nomes como Lily Tomlin e Alan Alda para liderar seus elencos. A partir daí, aos poucos, foi agregando novos nomes conceituados ao seu currículo de amigos até se tornar sinônimo de celebração garantida. Por O Vencedor, deu Oscar para Melissa Leo e Christian Bale. Com O Lado Bom da Vida, emplacou indicações em todas as categorias de atuação – o que não acontecia há décadas -, sem falar da celebração de Jennifer Lawrence, claro. O feito de trazer holofotes para todos os intérpretes de um filme seu se repete esse ano com Trapaça. O porém é que, agora, fica mais evidente do que nunca a verdade de que David O. Rusell é um mito criado involuntariamente pelos atores que participam de seus filmes.
Mesmo com aprovação de crítica e público, seus trabalhos nunca são plenamente convincentes. E o que antes poderia ser definido como uma mera implicância de minha parte, agora é plenamente justificado por esse Trapaça, que surpreende pela total falta de personalidade. É sempre perigoso tentar emular estilos de outros diretores porque é fácil confundir homenagem com cópia ou pretensão. O. Rusell não escapou dessa armadilha, e o que vemos em seu novo longa é uma infinita sucessão de momentos que tentam replicar os acertos de narrativa e estética que fizeram de Martin Scorsese, por exemplo, uma grande referência. Mas citar apenas o realizador do recente O Lobo de Wall Street como uma das “inspirações” do filme é ser bastante generoso. Pelo menos outros dois momentos são descaradamente copiados: aquele que Jennifer Lawrence canta Live & Let Die na cozinha (Cate Blanchett já havia feito o mesmo – e melhor – há mais de dez anos em Vida Bandida, também um longa sobre trapaceiros) e outro em que Robert De Niro surpreende ao falar árabe (impossível não lembrar da fluência italiana igualmente inesperada de Christoph Waltz em Bastardos Inglórios).
Por isso, é até meio chocante essa falta de personalidade do diretor, pois ele, mesmo tendo realizado filmes completamente superestimados, nunca tinha demonstrado ser tão descuidado nesse sentido. Pode até ser que Trapaça consiga enganar muito bem um público menos desprovido de referências, mas certamente é desanimador para quem está atento a tais detalhes. Assim, muitos aspectos interessantes do filme acabam sendo ofuscados por essa história capenga, como a boa direção de arte, os excelentes figurinos e, principalmente, o bom senso de O. Rusell para a comédia aqui. Quem tenta contornar a situação, mais uma vez, é o elenco. E, como não é novidade para ninguém, os atores são o que existe de melhor, da versatilidade cada vez mais acentuada de Christian Bale a um momento bastante diferenciado de Amy Adams (finalmente abandoando o estereótipo de meiga e ingênua), passando pela boa presença de Jennifer Lawrence. Admirável como o diretor reutiliza atores de filmes passados, reposiciona-os e acrescenta novos sem que eles pareçam deslocados ou repetitivos. Esse é um mérito que não podemos tirar de O. Rusell.
Entretanto, não dá para confundir excelente direção de atores com direção como um todo. Trapaça pode até ser light e divertido, mas não tem voz própria e é constantemente sabotado por uma montagem problemática e responsável por tirar boa parte do ritmo da trama. A forma pop com que muitas vezes Trapaça se desenvolve, apoiada naquele visual de décadas passadas e em cenas cadenciadas por uma trilha de célebres canções, ajuda bastante. Só que, de novo, temos o problema da cópia: Paul Thomas Anderson já fez muito melhor em Boogie Nights – Prazer Sem Limites. É verdade que Trapaça não cai em clichês (nada de voos internacionais, traidores dentro da equipe ou revelações bombásticas de última hora), mas seria interessante assistir a esse filme com referências cinematográficas zeradas. Será que daria para ser mais benevolente com o resultado? Para um diretor com uma marca tão registrada de reunir bons atores em filmes mais descontraídos, não era de se esperar alguém querendo copiar tanto e querendo agradar sabe-se lá quem. A investida tem dado certo (prêmios no Globo de Ouro, líder de indicações ao Oscar e mais uma vez uma boa média de aprovação do público). Entretanto, se antes dava para compreender a festa excessiva para O. Rusell, agora é realmente estranho ver que tantos estejam, com o perdão do trocadilho, caindo nessa trapaça.
FILME: 6.0
Pingback: Trapaça | Uma Dose de Cinema
Kamila, pena que, fora os atores, os filmes dele nunca me conquistam…
Hugo, direção, montagem, roteiro… Achei tudo bem problemático.
Clóvis, eu gosto dos elencos dele, mas, assim como você, nunca achei nenhuma das atuações merecedora de prêmios.
Pretendo ver esse filme amanhã, mas, ao que parece, “Trapaça” não passa de outra obra superestimada de David O. Rusell. Sinceramente, até mesmo as atuações de seus filmes eu considero hipervalorizadas. São boas? Sim, mas não a um nível de receberem Oscar. Porém, o que mais me impressiona nessas críticas referentes ao filme é como todos mencionam que ele possui um quê de Scorsese.
O que me incomodou realmente no filme foi a edição, totalmente frenética em muitos momentos. Acho que isso dificulta o envolvimento do espectador com cada cena.
Vou assistir a “Trapaça” amanhã, mas nem sempre O. Russell foi conhecido como esse grande diretor de atores. É só lembrar aquele vídeo polêmico dele com a Lily Tomlin, que tem no You Tube, durante as filmagens de “I Heart Huckabees”. Não sei se ele começou a controlar seu temperamento, mas, sem dúvida, é o diretor recente com o maior toque de Midas para os seus atores. Além disso, ele tem formado uma companhia de atores de respeito com vários talentos que se repetem em seus filmes.