Do trio de jovens atores nascidos ou criados na Bahia que ganharam o Brasil, Vladmir Brichta era o único que ainda não tinha um filme para chamar de seu. Enquanto Lázaro Ramos se lançou nacionalmente com O Homem Que Copiava e Wagner Moura ganhou plateias até internacionais com Tropa de Elite, Brichta (nascido em Minas Gerais, mas cidadão baiano desde criança) era apenas um tímido coadjuvante cômico em filmes como A Máquina e A Mulher Invisível. Mas eis que surge este A Coleção Invisível, que lhe dá as devidas chances para explorar uma vertente dramática que, mesmo também desconhecida na TV, já estava presente na carreira do ator desde a década de 1990, quando ele ganhou os palcos de teatros baianos com peças como Calígula e Hamelin. Agora, no filme de Bernard Attal, Brichta encontra a chance de expandir esse diálogo com o público: como Beto, um jovem que, após perder os amigos em um acidente de carro, cai nas estradas do interior da Bahia para encontrar uma coleção de gravuras, ele mostra que oportunidades como essa deveriam aparecer sempre na sua carreira cinematográfica.
A Coleção Invisível é primeiro um filme sobre a busca e depois sobre o que é encontrado (ou não). Nada de clichês típicos de um road movie. Na história roteirizada por Bernard Attal, Sérgio Machado e Iziane Mascarenhas – baseada no conto homônimo do alemão Stefan Zweig -, tudo é trabalhado por meio de sutilezas. Por um lado, esta escolha pode minar a aceitação de várias plateias que esperam uma viagem cheia de aventuras e transformações. Por outro, tem tudo para surpreender quem espera algo fora do convencional, uma vez que A Coleção Invisível não aposta na transformação completa de um sujeito que cai na estrada de um jeito e chega ao fim dela como uma pessoa completamente diferente. O que é mostrado no longa de Attal é apenas o início de uma mudança. A história termina e o protagonista recém começa a sair da juventude para assumir o papel de um homem maduro. Por isso, não espere muitas movimentações nesse longa quase contemplativo e silencioso que nunca descamba para o pedante. Afinal, é exatamente aí que está sua benção e maldição: por ser tão sutil, corre o risco de ser incompreendido pelo público, que pode achar que nada acontece ali – o que não é verdade.
Último filme do falecido ator gaúcho Walmor Chagas, A Coleção Invisível, contudo, também não deve ser limitado a esse título. Até porque, além dele, todo o elenco está muito bem, inclusive aqueles coadjuvantes de breves participações como Clarisse Abujamra, Paulo César Pereio e Ludmila Rosa. Só que o terreno é mesmo de Vladimir Brichta. Vencendo o “empecilho” da beleza (ele tem todo o jeito de galã, mas, aqui, isso está longe de ser um problema) e da fama com a comédia (especialmente agora que está no com o programa Tapas & Beijos ao lado de Fernanda Torres), ele cria um personagem extremamente verossímil que convence com todas as suas facetas dramáticas. Vladimir nunca soa forçado como o jovem de balada que conhecemos no início do filme e muito menos como o homem introspectivo que tenta se achar em uma nova vida posteriormente. Assim como o próprio filme, a interpretação é minimalista e pede atenção para ser devidamente apreciada.
Em uma produção que tem a própria Bahia como personagem, conseguimos também nos sentir parte de tal universo. Ao explorar o interior do Estado, a pobreza daquelas regiões e a própria vivência de quem trabalha com o cacau, sentimos o cheiro da terra e a temperatura baiana… Estamos lá. E isso só ajuda o andamento desse drama, cujo cenário também é fundamental para moldar o protagonista. Terminando um pouco abruptamente e com um leve desvio de rota ao abraçar de última hora um pequeno clichê com um personagem coadjuvante (a divertida criança que está sempre cercando o protagonista), A Coleção Invisível pode até não ser aquele tipo de filme que chamamos de empolgante – mas talvez nem o queira ser mesmo. A sensação que fica, ao término dele, é que todos os pequenos acertos e detalhes se acumulam e, quando os créditos sobem, ficamos com uma vontade de acompanhar mais daquela história. Para alguns, um problema de incompletude. Para mim, um atestado de fuga do convencional. Assim como na vida, nem sempre temos todas as respostas estão ao nosso alcance. O tempo deve tornar A Coleção Invisível ainda melhor.
FILME: 8.0
Kamila, e é surpreendente ver esse primeiro papel dramático do Vladimir, porque ele se sai muito bem!
Sua observação sobre o Vladimir Brichta, no primeiro parágrafo, foi muito precisa. Gosto dele como ator. Acho que ele tem muita versatilidade e trabalha bem, independente do gênero. Esse “A Coleção Invisível” parece ser muito bom.