“Quarto número oito? O senhor de fraldas? Um dia, esse será você. Isso se você tiver a sorte de viver tudo isso. Todos nós? Os que estão morrendo? Você será um de nós. E nós costumávamos ser você. É o ciclo da vida, Simba! Eu vou morrer e você estará sujando suas calças. E também desejando ter alguém que se importe o suficiente para limpar a sua sujeira”. Esse trecho – em uma tradução literal – transmite toda a honestidade de The Big C: Hereafter, última parte da jornada de Cathy Jamison (Laura Linney), uma professora de história que, lá na primeira temporada exibida em 2010, descobriu ter câncer – o que mudou radicalmente sua forma de ver o mundo. E, após alguns deslizes e bobeiras (a terceira temporada nada acrescentou), o programa criado por Darlene Hunt chega ao fim, resgatando o que sempre existiu de melhor na série e adicionando uma bem-vinda sinceridade que tira The Big C do lugar comum das tramas envolvendo personagens que lutam contra o câncer.
Se fizermos um retrospecto dos personagens que tiveram a doença na TV, é fácil encontrar soluções fáceis para todas as situações. O esquema é sempre o mesmo: eles descobrem a enfermidade e sofrem episódios a fio, mas logo os tumores diminuem e tudo volta à normalidade. Mas o câncer em The Big C não é uma subtrama. É a engrenagem. Por isso mesmo, era inevitável, nessa temporada final, que os roteiristas batessem de frente com esse difícil assunto. Seria desonesto com o espectador, mesmo que a série seja uma dramédia. Contada em um formato inteiramente novo (quatro episódios de uma hora), o quarto ano colocou as risadas em segundo plano para trazer um olhar muito pé no chão da luta de Cathy Jamison contra o câncer. O resultado? Poucas vezes – no cinema ou na TV – acompanhamos um retrato tão digno da condição em questão. Os roteiristas de The Big C: Hereafter abandonam concessões e merecem parabéns pela atitude, já que o texto nos lembra de algo raro nos dias de hoje em termos de TV: simplesmente mostrar a vida como ela é já se torna meio caminho andado para o sucesso.
Falar sobre o que acontece nessa temporada final é entregar suas surpresas, mas vale dizer que é bom preparar os lenços: todos os episódios possuem pelo menos um momento de partir o coração. Há quem possa estranhar o clima mais denso e as sempre presentes discussões sobre a morte e suas ramificações, mas rejeitar essa veracidade é perder tudo o que a temporada tem de melhor. Todos saem ganhando nessa reprodução da vida real. Só que, claro, quem reina absoluta é Laura Linney. Vencedora do Globo de Ouro pelo primeiro ano, ela tem, aqui, aquele que é possivelmente o melhor desempenho de sua carreira. Com os olhos marejados durante praticamente todo o tempo, Linney abandona vaidades e se entrega às fragilidades físicas e emocionais de sua Cathy Jamison. É impossível ficar indiferente à situação da protagonista, que ganha contornos extremamente humanos e adoráveis na mão da atriz. Linney torna a personagem um membro de nossa família e vê-la sofrer é extremamente doloroso. Nós torcemos por ela e queremos sua paz. Independente do lugar onde ela esteja. Um verdadeiro show de atuação.
É duro ver The Big C partir. Hoje, o programa já não conta com os mesmos fãs que tinha em seu início – muitos se desconectaram da série na segunda e terceira temporada – mas fica a dica: vale a pena retornar ao programa apenas para acompanhar essa bela reta final. Não apenas foi um fim simbólico e satisfatório para Cathy, como também fechou com a devida sutileza todos os outros ciclos: até mesmo personagens insuportáveis como Adam (Gabriel Basso), por exemplo, tiveram redenção. Pontas não ficam soltas em The Big C: Hereafter, cuja honestidade perante o câncer e mais especificamente a vida firma o desfecho da jornada da protagonista como um dos pontos altos da TV em 2013. Foi um ciclo que terminou no momento certo e a mensagem que fica é: nesse jogo chamado vida, podemos ser ricos ou pobres, bem sucedidos ou fracassados, famosos ou desconhecidos… Mas, no apagar das luzes, somos todos iguais. Não há circunstância que mude isso. The Big C vai fazer falta.
QUARTA TEMPORADA: [8.5] 4.01 – Quality of Life [8.0] 4.02 – You Can’t Take it With You [8.5] 4.03 – Quality of Death [8.5] 4.04 – The Finale
Kamila, acho que você vai adorar esse final de “The Big C”. É impossível não se emocionar!
Bruno, a série é preciosa de verdade na primeira e agora nessa última temporada. Entendo quem desistiu da série no meio do caminho, já que ela perde bastante o foco. Mas vale a pena voltar para conferir esse final!
Pois é Matheus, eu larguei The Big C na primeira temporada e confesso que me deu vontade de voltar a assistir… Eu me empolguei muito com a ideia e com o piloto, mas aos poucos fui desanimado.
Essa mensagem final que vc captou é ótima e me remete aos créditos finais de Barry Lyndon: It was in the reign of George III that the aforesaid personages lived and quarreled; good or bad, handsome or ugly, rich or poor they are all equal now
Parabéns pelo texto, Matheus. Eu deixei de acompanhar “The Big C” há um bom tempo, por pura falta de tempo livre para acompanhar a série, mas estou curiosa para ver esse desfecho e preparada para o turbilhão emocional que será ver isso. Imagino que foi muito forte. Veremos se o Emmy volta a reconhecer a série com esse final.