Três atores, três filmes… com Reinaldo Glioche

Reinaldo Glioche é um dos queridos amigos cinéfilos que acompanho à distância há alguns anos. Hoje ele é editor de Cultura e Entretenimento do portal iG, mas nos esbarramos muito antes, mais especificamente quando ele ainda comandava o seu saudoso blog Claquete Cultural. Estreitamos nossos laços cinematográficos no Twitter, plataforma que Reinaldo, como o ótimo jornalista que é, sabe aproveitar tão bem. Dos blockbusters que faturam bilhões mundialmente às pérolas que precisam ser descobertas por todos os públicos, ele, assim como eu, é um grande entusiasta do círculo de premiações. Tanto seus textos no iG quanto a sua presença nas redes sociais são leitura indispensável para quem gosta de se manter informado sobre cinema com a devida dose de senso e crítico e ponderação. Sem mais delongas, deixo com vocês uma breve introdução que ele próprio preparou para a coluna e, claro, com as escolhas que ele defende com a propriedade que sempre lhe foi característica. Entre as três interpretações selecionadas, uma delas conquista o bicampeonato em quase 50 participações contabilizadas até aqui: Meryl Streep, mais uma vez citada com seu inesquecível desempenho em As Pontes de Madison, um dos melhores filmes de Clint Eastwood.

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Comecei a escrever sobre cinema com dez anos. A cinefilia foi algo que despontou em mim muito cedo e me ajudou a me formar como ser humano. Optei pelo jornalismo em detrimento da carreira no direito e mergulhei no sonho e desafio de atuar no jornalismo cultural e promover e viver o cinema da melhor maneira possível. Com o advento da blogsfera e a facilidade que a internet deu às pessoas de expressarem suas paixões e anseios, criei o blog Claquete Cultural, que me possibilitou conhecer pessoas maravilhosas que compartilhavam comigo do mesmo amor febril e impetuoso pelo cinema – ainda que com a maioria dessas pessoas a relação se dê apenas no campo virtual. O blog foi descontinuado em meados de 2014, quando eu já atuava como jornalista cultural no iG, onde entre outras atribuições editava a coluna Cineclube, idealizada para aprofundar a cobertura de cinema de um portal de notícias, mais inclinada a blockbusters por questões comerciais e práticas. Desde junho de 2016 sou editor de Cultura e Entretenimento do portal iG. Sou carioca, mas moro em São Paulo desde 1995 (ano do lançamento de um dos filmes que listo aqui).

Michael Fassbender (Shame)
De vez em quando acontece de um ator ter um ano especial com lançamentos engatilhados. Foi o caso do alemão naturalizado irlandês Michael Fassbender em 2011. Até então o ator era pouco conhecido do público, a despeito de já ter penetrado na epiderme da cinefilia com obras como “Fome” (2008) e “Bastardos Inglórios” (2009). Foram cinco filmes em 2011, sendo o mais famoso deles – e responsável pelo começo de sua popularização – “X-Men: Primeira Classe”, em que encarnava uma versão mais jovem e angustiada de Magneto, um dos personagens mais complexos oriundos das HQs. O romance de época “Jane Enyre”, o espetacular filme de ação de Steven Soderberg “A Toda Prova” e “Um Método Perigoso” de David Cronenberg, foram outros grandes filmes estrelados pelo ator naquele ano. É “Shame”, no entanto, o filme que o distingue. Se é justo dizer que a carreira do ator, mesmo com duas indicações ao Oscar que viriam por “12 Anos de Escravidão” e “Steve Jobs”, entrou em decadência depois do ápice que foi em 2011, é por causa de seu trabalho aqui, um dos mais impressionantes da década. A nudez completa pode ser um desafio para um ator, mas desnudar a alma de um personagem é muito mais estimulante – e complicado. Brandon, seu personagem, que é viciado em sexo, é pura dor. Um misto de tristeza e impulso em uma sonata desesperada que Fassbender tangencia com agudeza sem deixar de ser minimalista. Um equilíbrio tão raro que pode ser tido como imemorial.

Meryl Streep (As Pontes de Madison)
Eu tinha 12 anos quando “As Pontes de Madison” (1995) foi lançado e pouco mais de 14 quando o assisti. A cinefilia já estava embrenhada em mim desde muito cedo, mas este filme foi a porta de entrada para um dos maiores valores que existe no cinema: Meryl Streep. Sou fã confesso de Clint Eastwood como diretor, mas ali, aos 14 anos, não foi sua direção inequívoca, sensível e resoluta que me cativou, mas sim a densidade da atuação de Streep. Já tinha visto, claro, filmes com ela. Mas permaneciam inéditos alguns tesouros como “Kramer vs. Kramer”, “A Escolha de Sofia” e “Ironweed”. Sua Francesca é a afirmação de uma escolha dolorosamente romântica, um indício dos pesares da vida, das renúncias inerentes, de seus labirintos fortuitos, e é uma heroína que Streep habituou-se a fazer melhor do que ninguém. A filmografia da atriz nos anos 90, tirando duas comédias no alvorecer da década, se construiu sobre esse perfil maravilhosamente iluminado em “As Pontes de Madison”, decididamente um de meus Eastwoods favoritos e um drama romântico atemporal que tem na atuação de Streep não o único, mas o maior de seus virtuosismos.

Bradley Cooper (O Lado Bom da Vida)
Eu queria colocar Daniel Day Lewis por “Trama Fantasma” aqui, mas peço licença ao leitor para explicar esse plot twist na minha escolha. Day Lewis é um gênio e creio haver pouca ou quase nenhuma dissonância quanto a isso. É um ator magnético, metódico que mesmeriza não só a mim, mas a todos os leitores desse espaço a cada novo trabalho. E aí tem Bradley Cooper. Um cara que parecia destinado a comédias bobas lá atrás com “Penetras Bons de Bico” (2005) e “Sim Senhor” (2008) e que virou astro com o surpreendente (e bom, sim!) “Se Beber, Não Case!” (2009), mas que fez a opção por virar ator de verdade (o que é louvável, mas nem sempre possível dentro das engrenagens de Hollywood). “O Lado Bom da Vida” é o sensacional ponto de partida dessa trajetória que ostenta sete indicações ao Oscar nesta década, quatro como ator, sendo três delas seguidas – algo só conquistado por Russell Crowe e Spencer Tracy. Não é um dado desprezível. Cooper também está aqui porque defende uma atuação que conjuga drama e comédia com rara beleza e muita intuitividade. É um trabalho de muitas camadas e que a percepção que se tinha dele à época nublou. À luz de sua realização artística com “Nasce Uma Estrela” esse julgamento pode ser mais bem composto. Em “O Lado Bom da Vida”, ele vive Pat, um cara com transtorno obsessivo compulsivo que quer colocar sua vida em ordem e cisma de reconquistar uma mulher que não o quer mais e acaba se apaixonando pela pessoa errada na hora certa. Ou seria a pessoa certa na hora errada? Cooper dá graciosidade, urgência e fidedignidade a esse homem e ao retrato de uma desordem mental que acomete a tantos nesses tempos de relações líquidas.

Um comentário em “Três atores, três filmes… com Reinaldo Glioche

  1. Ótimas escolhas do Reinaldo. Três atuações, realmente, marcantes e bem representativas dos anos mais recentes.

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