Direção: Ian SBF
Roteiro: Fábio Porchat e Ian SBF
Elenco: Fábio Porchat, Irene Ravache, Marcos Veras, Luis Lobianco, Leticia Lima, Giovanna Lancellotti, Marcelo Valle, Silvio Matos
Brasil, 2015, Comédia/Drama, 100 minutos
Sinopse: Bruno (Fábio Porchat), um editor de imagens recém-separado da mulher (Giovanna Lancellotti), começa a deixar de ver as pessoas. Ele tropeça no ar, esbarra no que não vê, até perceber que as pessoas ao seu redor estão ficando invisíveis. Com a ajuda da mãe (Irene Ravache) e do melhor amigo (Marcos Veras), ele tentará descobrir o que se passa em sua vida.
Dias atrás, procurando o que ver pela TV, me peguei assistindo mais uma vez ao programa Saia Justa, no canal GNT. O quarteto de apresentadoras debatia sobre humor. Em certo ponto, a comediante Monica Martelli foi certeira ao colocar na roda a profissionalização da comédia – ou mais especificamente como os atores que criam carreira neste gênero não são levados a sério. Martelli não hesitou ao enfatizar: atores de comédia parecem viver sempre com a obrigação de ter uma piada na ponta da língua e suas interpretações nunca são consideradas dignas de sequer receber prêmios. Não é verdade? Vejam Jim Carrey, por exemplo, em Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças, ou, então, Steve Carell em Foxcatcher – Uma História Que Chocou o Mundo. Ambos atores com uma carreira notável na comédia mas que somente em dramas foram levados “a sério” por crítica e premiações. É uma lógica tola, e o cinema nacional agora também tem um representante deste nicho: Fábio Porchat. Famoso pelos episódios da websérie Porta dos Fundos, o ator agora mostra sua faceta dramática no longa Entre Abelhas, onde também é autor do roteiro ao lado do diretor Ian SBF.
A trama é, na realidade, uma comédia dramática que se sobressai justamente no drama. É curioso como a parte cômica de Entre Abelhas é o que mais atrapalha o filme como um todo. Nada contra o humor balizar uma história essencialmente triste, mas a bonita proposta do longa se dilui em uma sucessão de piadas óbvias e populares demais para as reflexões do roteiro. A proposta é bárbara: o que você faria se, pouco a pouco, as pessoas desaparecessem de sua vida? Como seria deixar de enxergar não apenas o cobrador do ônibus ou a atendente do bar, mas também o seu melhor amigo, por exemplo? “Quando você deixa de ver menos os outros você enxerga mais a si mesmo?” pergunta o psiquiatra do protagonista Bruno (Porchat). E, no fundo, Entre Abelhas é, ao contrário do que a comédia quase sufoca, uma história sobre isso: conviver consigo mesmo, ver seus próprios defeitos na solidão e perceber o que vale a pena quando perdemos algo.
O que acontece é que, por ser um filme estrelado por Porchat e bancado pela Globo Filmes, seria improvável Entre Abelhas receber um tratamento puramente dramático e profundo. A comédia precisa estar aqui. Fábio Porchat tem que fazer bilheteria – e, claro, fazer rir. Desta forma, por mais que o filme de Ian SBF tenha uma proposta bastante interessante e a desenvolva com sutilezas, é financeiramente imperdoável que Entre Abelhas decepcione as grandes massas que vão ao cinema pelo comediante. Porchat e SBF obedecem a lógica e dedicam praticamente a primeira metade do filme a só fazer graça com a situação do protagonista, o que torna o resultado extremamente repetitivo. O humor é duvidoso, afinal, quando não se apoia demais em Marcos Veras como o melhor amigo machista que só fala de sexo, traição e prostitutas, o roteiro se presta até mesmo a fazer com que Irene Ravache sexualize cenouras e pepinos. É o preço que se paga por ser Fábio Porchat na Globo Filmes.
O drama de Entre Abelhas ganha seus melhores contornos na meia hora final, quando o roteiro abre um considerável espaço para válidas reflexões. As cenas em que o protagonista caminha em ruas desertas ou entra em restaurantes vazios representam o auge criativo do filme. Assim, se as piadas inexistissem ou tivessem pelo menos a mesma esperteza do drama, não estaríamos apenas diante de um ator que parece querer – e ter tudo – para ser levado a sério, mas também de um roteirista inteligente que, apesar de suas origens que nunca devem ser negadas ou desprezadas, não merece estar preso às amarras comerciais quando resolve expandir sua criatividade em projetos diferenciados. Os que esperam uma versão cinematográfica de Porta dos Fundos podem se frustrar. Tudo é muito claro: Porchat quer ir além. Permitam que ele vá.