Na TV… por que Looking é uma decepção?

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Diretamente ou não, Looking tinha uma missão muito clara: ocupar a vaga de série assumidamente gay que há anos estava sem um verdadeiro dono. Credenciais sobravam, já que esta é uma produção da HBO. Mais importante ainda: Looking é criada por Andrew Haigh, diretor de Weekend, o filme gay mais interessante dos últimos anos. E é justamente por ser diretor especificamente deste filme tão sensível e humano que o seriado estrelado por Jonathan Groff tinha uma tarefa ainda mais importante: a de quebrar na televisão todos os estereótipos criados anos atrás por Queer as Folk, programa bastante fantasioso – e questionável neste sentido -, sobre o mundo gay.

Ora, se, em Weekend, Andrew Haigh estava muito mais preocupado com as questões íntimas e sentimentais de um casal que se conhece em uma festa e se apaixona em um fim de semana juntos, era de se esperar que, assim como o longa, a nova série do diretor abandonasse a superficialidade tão comum em histórias do gênero e desse continuidade a essa proposta de humanização tão bem-vinda. Ele de certa forma tenta, já que os personagens de Looking não são, por exemplo, jovens loiríssimos de olhos azuis que vestem camisetas justas de grife ou ostentam cabelos estilosos. Mas a fuga dos estereótipos para no visual de cada um deles mesmo, pois, no episódio-piloto, Looking abre sua história já com o protagonista Patrick (Groff) transando com um desconhecido no meio do mato.

A partir daí, qualquer diálogo ou situação de Looking terminará sempre no mesmo assunto: sexo. Talvez o faça de forma mais disfarçada, é verdade, mas nunca escapa disso. É o amigo mais velho de quase 40 anos que procura homens em aplicativos no celular, o jovem artista que agora mora com o namorado mas cujo único conflito é volta e meia precisar apimentar a relação com sexo a três, o chefe de uma empresa que flerta incessantemente com o funcionário mesmo ambos com ambos comprometidos, e por aí vai… Os defensores podem dizer que o próprio título da série já indica que os personagens estão todos à procura, “na pista pra negócio”, mas será mesmo que, para discutir a busca de um alguém para os personagens, o programa precisava direcionar sempre todas as situações para questões sexuais?

Se Looking parecia uma versão gay de Girls, por exemplo, afim de mostrar como a amizade é fator fundamental para que cada personagem encontre forças para viver os dilemas de suas vidas particulares, logo tal teoria vai por água abaixo porque a série não consegue nem fazer com que o espectador sinta qualquer sintonia entre eles. A amizade não é uma força extra de Looking, onde o personagem mais interessante, em comparação às outras figuras apáticas, é mesmo o “líder” Patrick – o que, sinceramente, não quer dizer muita coisa. Talvez mais pela presença de Groff – homossexual assumido na vida real -, do que necessariamente por méritos do roteiro.

Também falta personalidade em todos os personagens de Looking. O tempo que a série tinha para pelo menos introduzir o perfil das figuras que protagonizam a história é perdido com questões completamente discutíveis. Nos primeiros episódios – o recorte ideal e obrigatório para contextualizar o espectador -, Haigh está mais preocupado em fazer graça sobre o mistério do pênis de determinado personagem ser circuncidado ou não do que esmiuçar as motivações e conflitos de seus protagonistas. Mas o mais curioso de tudo é que Looking nunca assume por completo uma personalidade: é sempre o clichê gay disfarçado de história introspectiva em seu ritmo e visual.

Só que perder tempo é um problema muito sério para o programa de Andrew Haigh. Isto porque a série é estruturada em apenas oito episódios de aproximadamente 30 minutos. Reza a lenda de que, quanto mais resumido, mais a essência deve ficar evidente. No caso da série, o problema é que sequer parece existir uma essência realmente interessante para ser explorada em uma série de TV. Os conflitos de Patrick, Agustín (Frankie J. Alvarez) e Dom (Murray Bartlett) são rasos, incapazes de consolidar uma verdadeira dramaticidade ou de sustentar o interesse por muito tempo.

É quando se dedica a mostrar a construção de uma intimidade entre dois personagens que começam a se apaixonar que Looking ganha força. Um episódio em especial evidencia bem este acerto. Em Looking for the Future está presente tudo o que a série deveria ser e não é: detalhista em seus diálogos, envolvente e, acima de tudo, repleta de carinho e entendimento por seus personagens. É, enfim, a beleza de um relacionamento como qualquer outro. Não à toa, soa como um capítulo avulso, já que a história simplesmente para afim de narrar uma tarde repleta de conversas e descobertas entre Patrick e seu novo interesse amoroso Richie (Raúl Castillo). O episódio termina e tudo volta para o resultado de sempre.

Caso seguisse essa lógica de mostrar mais conflitos internos e emocionais do que sexuais, Looking certamente estaria muito perto de alcançar o brilhante resultado de Weekend. Contudo, baseado no posicionamento que a série adotou nesta primeira temporada, é fácil concluir que este é um programa basicamente sem identidade, que tenta ser mais alternativo mas não pensa duas vezes antes de sutilmente descambar para a lógica de que gays só pensam e falam sobre sexo. Por pouco, não chega a ser um desserviço para seu público-alvo. Assim, Queer as Folk, por mais imaginativa e explícita que fosse, tinha a seu favor algo simplesmente valioso: identidade. Boba e exagerada? Sim. Mas pelo menos plenamente ciente de que era isso que desejava mostrar. Algo que Looking, em um eterno impasse insosso, não consegue fazer. E nem conseguiria, já que não sabe sequer qual caminho quer seguir. É, no final das contas, como um gay que não consegue se assumir para si mesmo e que está apenas à procura de parceiros “discretos”.

4 comentários em “Na TV… por que Looking é uma decepção?

  1. La série looking com Lauren Weedman de ficção centra-se nestas três personagens de orientação gay … mas, como todos os outros, têm as suas esperanças, seus medos, seus problemas no trabalho, com os seus parceiros … Não seja tão simples de reduzir tudo a “uma série de gays”.

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