52º Festival de Cinema de Gramado #7: “Pasárgada”, de Dira Paes

pasargadagram

Pasárgada é um projeto muito especial para Dira Paes. Quase uma espécie de chamado. Neste trabalho que marca a sua estreia na direção de longas-metragens, ela assume diversas frentes e reúne uma equipe muito enxuta para contar a história de Irene, uma ornitóloga na casa dos 50 anos que, durante um projeto de pesquisa no meio da Mata Atlântica, redescobre sua tropicalidade após conhecer Manuel (Humberto Carrão), um jovem guia que fala a língua dos pássaros e traz à tona seus dilemas como mulher, mãe e profissional. Intimamente ligada com questões da natureza e da proteção da Amazônia, Dira não poderia fazer outro filme em sua primeira investida atrás das câmeras, uma vez que “Pasárgada” contempla questões muito caras à atriz do ponto de vista pessoal.

O que poderia ser o simples capricho de uma grande atriz querendo alçar outros voos na carreira se revela genuíno na medida em que Dira não tenta fazer de “Pasárgada” uma panfletagem ambiental. Na verdade, é até corajosa a sua escolha por fazer um filme de proposta imersiva, trabalhado muito no silêncio e atento aos sons da natureza. Uma vez que a protagonista está atenta a cada movimento dos pássaros, o filme busca nos colocar ao lado dela com longas cenas de contemplação e de admiração de Irene com o que ela descobre em meio à mata. O encontro com o personagem de Humberto Carrão amplia essa dinâmica, pois, com ele, a protagonista encontra um cúmplice que parece falar a sua mesma língua e que, de certa maneira, desafia a solidão com a qual ela conscientemente se comprometeu.

Dira acerta na dinâmica com a natureza, mas as engrenagens que fazem a história avançar são bem menos orgânicas. Elas se concentram nas conversas que Irene tem por videochamada, como, por exemplo, com o estrangeiro ao qual ela deve prestar contas de sua pesquisa. Ao mesmo tempo em que essa conversa específica revela uma faceta que desafia nossa relação com a protagonista — Irene não é uma heroína em prol da natureza, mas sim uma mulher envolvida em negócios escusos que trabalha no mapeamento e no contrabando de pássaros raros para o exterior —, também fragiliza Pasárgada pela previsibilidade com que gradativamente transforma a personagem. Suas nuances são melhores expostas na única conversa com a irmã, vivida por Cássia Kis, que evidencia o afeto entre as duas e, com economia, as diferenças responsáveis pelo isolamento de Irene.

Ainda assim, apesar dessas eventuais intervenções inseridas para levar a trama para frente, o filme é, ao fim e ao cabo, sobre a íntima relação da protagonista com a natureza. O fato de Dira, uma atriz de beleza singular e amazônica, ter ela própria essa conexão na sua vida pessoal, o que torna tudo mais natural e genuíno, assim como a presença de Humberto Carrão, com quem ela faz uma boa dupla. Nem sempre o ritmo é dos melhores e, em determinadas sequências, a montagem poderia ter economizado na contemplação, mas Pasárgada tem propósitos claros e, para uma diretora que escolheu um projeto tão pessoal para sua estreia, autênticos.

Um comentário em “52º Festival de Cinema de Gramado #7: “Pasárgada”, de Dira Paes

  1. Pingback: Dossiê: 52º Festival de Cinema de Gramado | Abraccine - Associação Brasileira de Críticos de Cinema

Deixe um comentário